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Thiago Maceira

Thiago Maceira é Managing Director no Banco de Investimentos e Head do Núcleo Tech do Itaú BBA. Com 20 anos de experiencia no mercado financeiro e no Itaú BBA desde 2013, o executivo já trabalhou na Goldman Sachs no escritório de Nova Iorque e no Citigroup em São Paulo. Thiago é bacharel em Economia pela Universidade de São Paulo e possui MBA pela Columbia Business School (prêmio Beta Gamma Sigma Alumni). Na coluna “Investimentos e Startups”, falará sobre as tendências do ecossistema de tecnologia sob o ponto de vista de investimentos.

Ano dos IPOs

IPOs de empresas de tecnologia brasileiras vieram para ficar

21/09/2020 19:46
O mercado de capitais brasileiro, apesar de toda a volatilidade gerada pelos impactos da pandemia na economia, tem um dos melhores anos de sua história em termos número de ofertas de ações. Até o começo de setembro, já foram 18 IPOs (oferta inicial de ações) de empresas brasileiras, que movimentaram cerca de R$ 20 bilhões, e 18 follow-ons (oferta subsequente de ações), levantando quase R$60 bilhões. Mesmo longe do final do ano, 2020 já é o segundo melhor na história em termos de volume captado na bolsa por empresas brasileiras.
Há mais de 40 empresas, de diversos setores, que ainda estão buscando fazer o IPO antes do final de outubro, e chama a atenção a quantidade de startups e empresas ligadas à tecnologia nessa fila. Seria isso uma tendência para ficar ou apenas uma coincidência neste trimestre?
A maioria das startups que não vão a público nunca tiveram a opção de fazê-lo, seja por questão de tamanho (mercado de capitais demandam empresas de porte maior, para que a ação seja negociada com liquidez), seja por tese de investimento (investidores tendem a preferir teses mais conhecidas e sem riscos significativos de mudança de tecnologia), ou seja por governança (com a necessidade de divulgação frequente de resultados). Mas esta situação tem mudado ao longo do tempo, o que deve levar a uma onda duradoura de empresas de tecnologia acessando a bolsa:

1. Tamanho

Os investidores de bolsa (investidores públicos) geralmente demandam empresas com alta liquidez, o que permite mais facilidade para conseguir comprar um volume relevante de ações ou de vender uma participação sem pressionar o preço da ação. Para isso, é importante que uma oferta de ações tenha um volume mínimo, o que está relacionado com tamanho da empresa (e sua avaliação).
Conforme eu mencionei no meu texto de maio, nos últimos anos vimos o crescimento e a maturação do setor de tecnologia no Brasil - o que motiva o surgimento de novas teses de investimentos e cria um “ciclo virtuoso” para o setor.
Com mais de 170 milhões de brasileiros com acesso à internet via telefone celular, o Brasil é um dos maiores mercados digitais no mundo. O processo de digitalização tem acelerado, mas quando comparamos com outras regiões, o país ainda é pouco desenvolvido, apresenta baixa penetração em e-commerce, pouca automação de processos, entre outros entraves. A pandemia acabou acelerando a agenda de digitalização não só no Brasil, mas em todo o mundo, o que permitiu à várias empresas aumentar significativamente seu tamanho e o potencial de mercado.
Essa mudança de tamanho do mercado colocou muitas das startups brasileiras próximas ao tamanho mínimo para conseguir fazer um IPO. Adicionalmente, dado que o tamanho da oportunidade ficou ainda maior, estas empresas hoje têm potencial para justificar a captação de volumes maiores de recursos para investi-los de maneira eficiente no crescimento.

2. Governança

Uma empresa listada passa a ter uma série de obrigações de divulgação e governança, incluindo a necessidade de apresentar resultados trimestrais, criação de comitês e capacidade de se relacionar com um grupo diverso de investidores.
As startups brasileiras vêm nos últimos anos melhorando consistentemente
seus níveis de controle e governança, seja pela presença de investidores
financeiros em suas estruturas acionárias, seja pela maturação dos modelos de
gestão para administrar empresas de porte maior.

3. "Efeito Magalu"

Com o crescimento da relevância das empresas de tecnologia e os impactos nas empresas tradicionais já listadas na bolsa, o interesse e entendimento pelos investidores públicos da dinâmica de empresas em alto crescimento aumentou substancialmente.
Adicionalmente, o sucesso dos IPOs da Locaweb, Arco, PagSeguro, ou a impressionante valorização das ações de Magazine Luiza por conta de sua estratégia digital, também reforçaram o apetite de investidores para estórias similares.

IPO é a melhor opção de capital para empresas de tecnologia?

O crescimento relevante nos últimos anos de capital de risco (venture capital) e de empresas em crescimento (“growth”) está permitindo que as empresas diminuam a velocidade de seus IPOs no mundo. Além disso, o interesse crescente de empresas tradicionais por novas tecnologias e o surgimento de fundos de private equity focados em empresas de tecnologia, estão aumentando o leque de “funding” para os empreendedores.
Um IPO traz mudanças importantes para o dia a dia de uma empresa, incluindo a constante flutuação de valor da empresa, que passa a ser público e mudar diariamente com o preço da ação, as obrigações contábeis, impactos em programas de remuneração de funcionários-sócios da empresa, entre outros.

No setor de tecnologia frequentemente a velocidade de implementação de uma inovação é tão importante quanto a inovação em si. A capacidade de “ocupar” um potencial segmento e tornar-se referência pode abrir novas avenidas de crescimento e de valorização.

O IPO permite acesso a capital relevante para financiar crescimento. IPOs acima de R$ 1 bilhão são comuns, ao contrário de rodadas de captação privadas, que tendem a ter volumes menores.

A chamada “janela de IPO” está aberta agora. Os mercados de ações acompanham os ciclos de expansão e queda da economia, e mercados podem “fechar” para novas ofertas caso haja uma piora na percepção da economia. As janelas de IPO às vezes podem fechar por períodos longos, portanto listar suas ações quando a janela está aberta é uma consideração importante.

Além disso, há uma demanda reprimida por IPOs de tecnologia de rápido crescimento, como demonstrado pela recepção positiva que os IPOs de PagSeguro, Arco, Locaweb, Afya, entre outros.

Por último, as empresas de tecnologia na bolsa têm performado muito bem, com suas avaliações bem acima dos níveis históricos.

A Locaweb, por exemplo, fez seu IPO no preço de R$ 17,25 e hoje a ação negocia por volta de R$ 60. Investidores internacionais focados em tecnologia participaram da oferta da empresa, desmistificando também a “obrigatoriedade” da listagem em Nova York.

Enquanto empresas privadas podem fornecer eventos únicos de liquidez privada por meio de vendas secundárias, empresas públicas têm uma capacidade muito maior de envolver e reter talentos por meio do desembolso contínuo de compensação baseada em ações.

Além disso, os IPOs são um grande marco e uma marca de conquistas para toda a equipe, aumentando a exposição da marca, além de “validar” a tese de investimentos para futuros potenciais funcionários.

IPOs podem
facilitar a capacidade de uma empresa de fazer aquisições, bem como facilitar
parcerias estratégicas. Mesmo que as empresas privadas possam fazer aquisições
com ações, é muito mais fácil fazer um negócio com “moeda” cujo valor é público
e líquido. Também é mais fácil entrar em parcerias estratégicas importantes
porque os parceiros em potencial têm informações facilmente acessíveis sobre os
negócios da empresa.

Cada empresa traça seu próprio caminho para o sucesso, e como disse em uma coluna anterior, o sucesso de uma empresa não é definido pelo tamanho de sua captação, mas sim pela satisfação de seus clientes. Assim, o que é melhor para uma empresa não é necessariamente o melhor para outra.

A boa notícia para o ecossistema é que, neste momento de mercado, a decisão de abrir o capital - ou não - é uma escolha que está nas mãos dos empreendedores.

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