Nos EUA, etanol é produzido principalmente a partir do milho| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

O presidente americano Donald Trump procurou acalmar os agricultores nesta semana afirmando que irá tomar medidas para aumentar o uso do etanol, combustível produzido à base de milho nos Estados Unidos e importante fonte de renda no meio rural.

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A medida visa agradar uma fatia do eleitorado de Trump que está alarmada com uma iminente guerra comercial com a China, que já ameaçou aumentar as tarifas sobre a soja americana.

“Vamos aumentar a mistura obrigatória para 15% e faremos isso pelos próximos 12 meses”, afirmou Trump durante uma sessão de fotos na Casa Branca, referindo-se ao combustível E15, que leva 15% de etanol em sua composição. Atualmente, o E15 não pode ser vendido durante todo o ano por causa da regulamentação de emissões de substâncias orgânicas. Dentro da Política Americana de Combustíveis Renováveis, a gasolina atualmente costuma conter apenas 10% de etanol (o Brasil pratica o maior percentual de mistura no mundo, com 27%).

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A proposta de Trump é, ao mesmo tempo, uma concessão ao senador republicano Charles E. Grassley, forte apoiador da indústria do etanol que também preside a poderosa Comissão Judiciária do Senado.

Mas o aceno de Trump pode ser inócuo diante das medidas da Agência de Proteção Ambiental (EPA), que vem concedendo isenções da mistura obrigatória para pequenas refinarias de petróleo que alegam dificuldades em cumprir a legislação.

Existem nos EUA mais de 50 pequenas refinarias processando até 75 mil barris de petróleo por dia, incluindo algumas pertencentes à ExxonMobil e à Chevron. A Andeavor tem quatro pequenas refinarias. A isenção da EPA, que visa atenuar dificuldades financeiras, na prática significa que essas corporações economizam dezenas de milhões de dólares em relação ao que teriam de gastar para cumprir o complexo sistema de créditos pelo uso do etanol.

Porta dos fundos

“Será que o governo entende que essas companhias, que têm lucros de bilhões de dólares, estão enfrentando alguma dificuldade financeira?” – perguntaram Grassley e quatro outros senadores de estados do Meio-Oeste numa nota pública divulgada na quinta-feira. Eles acusaram o diretor da EPA, Scott Pruitt, e as petrolíferas de, mais uma vez, usar “a porta dos fundos para tentar destruir a política do Congresso de apoio aos combustíveis renováveis”.

O percentual de mistura de etanol na gasolina há muito tempo vem dividindo empresas, produtores rurais e grupos ambientais, jogando legisladores estaduais contra as grandes petrolíferas e levantando questões sobre reais custos e benefícios ambientais.

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O tema foi uma pedra de toque entre presidenciáveis na região de Iowa. Durante a campanha, Trump prometeu promover o uso do etanol.

“Isso não vai compensar a perda de mercados na China e outros reveses”, disse Bob Dinneen, presidente da Associação de Combustíveis Renováveis, que aprova a medida. “Mas acredito que seja mais do que um mero gesto. Terá um impacto significativo numa importante cadeia de valor criada pelos produtores de milho”.

Usina de etanol de milho nos Estados Unidos 

No início da semana Pruitt apresentou um briefing sobre o assunto ao presidente Trump e ao senador republicano Ted Cruz, do Texas, que tem sido um crítico do tema, segundo lobistas.

A controvérsia em torno do E15 foi desencadeada pela Política de Combustíveis Renováveis, adotada pelo Congresso em 2005 e 2007, que ajudou a criar toda uma indústria de etanol – que hoje briga com as petrolíferas – ao exigir misturas cada vez maiores de etanol à gasolina.

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As tensões aumentaram na medida em que o percentual de mistura obrigatória foi se elevando – hoje está em 10% - e devem ficar mais agudas com a proposta do E15.

A indústria do petróleo, apoiada pela automobilística, reclama que ir além dos 10% resultará em danos aos motores dos carros, que não estão preparados para tanto etanol. O Instituto Americano do Petróleo também aponta potenciais danos a pequenos motores de máquinas de cortar grama e aparar jardins. Os estudos do Departamento de Energia indicam que essas suposições são exageradas.

E essa é apenas uma das polêmicas provocadas pela Política de Combustíveis Renováveis, que também é acusada de elevar o preço dos alimentos e provocar danos ambientais no Meio-Oeste.

Incertezas

“Aumentar a mistura do etanol para 15% durante o ano inteiro será uma grande vitória do lobby dos produtores rurais, mas, por outro lado, equivale a chutar o balde de uma proposta de reforma na política de etanol, que tanto precisamos, e ainda criará um ambiente de incerteza para a indústria, por que o assunto acabará sendo levado aos tribunais”, diz Jason Bordoff, diretor do Centro de Políticas Energéticas Globais da Universidade de Columbia.

A grande queixa das usinas de etanol é de que a EPA não aceita elevar a mistura para 15%. Ao bloquear a medida, a EPA tem usado o argumento de que é preciso diminuir as emissões orgânicas voláteis durante o período do verão.

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“O que está bloqueando o uso do E15 durante o ano todo, na verdade, é a distinção sem sentido que o EPA faz dos percentuais de mistura”, diz Dinneen. Ele acredita que se uma nova política for aprovada, pelos menos algumas refinarias, como a Sheetz, partirão de imediato para a mistura E15.

Qualquer mudança na legislação vai depender das regulamentações da agência, que são muito mais complexas e lentas do que um decreto de Trump. E os imbróglios recentes envolvendo o diretor Scott Pruitt criam mais dificuldades no caminho.

Enquanto isso, os senadores fazem seu jogo. No último dia 15 de março, um grupo de seis congressistas de estados agrícolas escreveu para o presidente Trump pedindo que ele “rejeite propostas que buscam enfraquecer este pilar da economia rural”. Eles apontaram que a política de combustíveis renováveis tem sido “uma linha de vida para os agricultores, promovendo a geração de empregos e atraindo bilhões de dólares de investimentos nas áreas rurais mais necessitadas”.