Mais de 9 bilhões. É este o numero de habitantes que a Organização das Nações Unidas (ONU) prevê para o planeta em 2050. A matemática é básica, mas nem um pouco simples: são 2 bilhões a mais de pessoas do que população mundial atual, ao passo que as áreas disponíveis para agricultura já estão quase esgotadas.
Para dar conta de tanta gente, a produção de alimentos terá que subir em 60% de acordo com a FAO, braço da ONU para a alimentação. Além do desafio da produtividade, num mundo em que, segundo especialistas, a oferta será bem mais controlada, o mesmo prato de comida – exatamente com os mesmos itens – terá que ser muito mais nutritivo.
O exercício é pensar décadas à frente, mas os exemplos de hoje já são preocupantes. “Um terço da população mundial sofre com a deficiência de nutrientes, principalmente o ferro. É um problema seríssimo”, afirma a pesquisadora Vânia Moda Cirino, do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar). “As principais variedades de feijão oferecem, para cada 100g, um teor de 6mg de ferro. A necessidade do organismo é de pelo menos 12mg por dia. Teríamos que comer o dobro”, acrescenta. O que, no futuro, pode não ser possível.
Humanidade terá que rever velhos hábitos de consumo
Enquanto 800 milhões de pessoas ainda passam fome no mundo, segundo a ONU, muito do que se produz vai parar na lata de lixo. “Uma pesquisa que fizemos em mais de 50 países mostrou que o desperdício de alimentos chega a um terço da produção, principalmente nos mais desenvolvidos”, frisa o representante da FAO no Brasil, Alan Bojanic, que, neste mês, participa do Fórum de Agricultura da América do Sul, em Curitiba.
“É possível acabar com a fome. Mas precisamos de muita tecnologia, respeito às leis ambientais e o fim do desperdício”, reforça Bojanic. Neste cenário e diante do crescimento populacional esperado, a América do Sul surge como polo produtivo e de conhecimento. “A região conseguiu resultados importantes no combate à desnutrição e é aqui que há condições para suprir a demanda de alimentos no mundo”, complementa.
Vânia é líder do projeto de biofortificação do Iapar. A técnica consiste em cruzar diferentes variedades da mesma espécie de planta para obter um tipo novo, com mais nutrientes. Recentemente, o instituto lançou um feijão com 9mg de ferro, ou seja, um teor 30% maior que o convencional. “É um alimento mais saudável numa quantidade menor. Pode ser a chave para o futuro”, salienta.
Desafios
A biofortificação ainda é recente. De acordo com o pesquisador José Luiz Viana de Carvalho, da Embrapa, ela começou a ser estudada há cerca 20 anos. “Eu mesmo tenho mais perguntas do que respostas”, brinca. José Luiz é um entre aproximadamente 500 cientistas do mundo todo que trabalham com a técnica atualmente.
Na Embrapa, assim como no Iapar, os alimentos escolhidos são os de maior aceitação: milho e trigo, por exemplo. No entanto, além de “bons de prato”, os biofortificados têm que ser bons de lavoura. “Porque se não tiver produtividade, o produtor nem olha”, diz o pesquisador. E ele completa: “a biofortificação é mais uma ferramenta contra a subnutrição, mas a vantagem é que conseguimos atingir o mundo todo. A fome não espera”.
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