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Alguns países importam gado vivo por não terem estrutura adequada para receber cargas frigorificadas | Arquivo/Gazeta do Povo
Alguns países importam gado vivo por não terem estrutura adequada para receber cargas frigorificadas| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

A venda de gado vivo por frigoríficos brasileiros ganhou os holofotes no início deste mês, quando duas organizações não governamentais conseguiram decisões judiciais que impediram que um navio carregado com 25 mil animais seguisse viagem à Turquia. A embarcação acabou sendo liberada, em função de um recurso do governo federal. O caso jogou luz sobre um setor que vem crescendo cerca de 20% ao ano e se tornou alternativa de receita para pecuaristas e empresas de alimentos, como a Minerva Foods. Entidades ligadas ao bem-estar animal, porém, pretendem continuar a tentar barrar a atividade.

Embora a venda de gado vivo seja uma prática antiga, esse segmento da pecuária ganhou força no início desta década, quando as vendas externas chegaram a 690 mil animais. De 2010 a 2012, o principal destino dos bois brasileiros eram os frigoríficos da Venezuela. Com a severa crise econômica do país vizinho, as vendas despencaram em 2015. Para viabilizar o negócio, pecuaristas acharam um novo cliente: o mercado de religião islâmica. De 2016 para cá, as vendas voltaram a subir, até atingirem US$ 263 milhões em 2017, segundo o Ministério do Desenvolvimento, mas ainda bem longe do auge em volume.

É um número pouco relevante diante dos abates anuais no País, que somam entre 35 milhões e 40 milhões de cabeças por ano, diz César Castro Alves, analista de pecuária da MB Agro. A fatia de 1% dos abates, na visão do especialista, não deve subir de forma significativa, pois o mercado global de bovinos vivos não cresce de forma significativa - o total movimentado está estacionado em cerca de 5 milhões de cabeças por ano. “É um nicho alimentado por questões religiosas. Pode ser boa opção para quando os preços estão ruins, pois vender boi vivo não agrega valor ao produto”, aponta Alves.

Altas de 20 a 30%

Apesar de o mercado como um todo não crescer, tanto empresários quanto o Departamento Americano da Agricultura (USDA) preveem altas de 20% a 30% nas exportações brasileiras em 2018. A Minerva Foods, dona da carga que foi retida em Santos, domina cerca de 40% das vendas de animais vivos - segmento em que as líderes em bovinos no País, JBS e Marfrig, não atuam.

Uma explicação para o interesse no negócio é o fato de os países muçulmanos pagarem prêmios sobre a cotação de referência do gado. Uma fonte ligada às exportadoras esclarece que os compradores exigem raças específicas - o gado Nelore, símbolo do plantel brasileiro, não é aceito em países muçulmanos, que preferem outros zebuínos. Diante das exigências, é necessário esforço para angariar animais para a venda externa, o que acaba se refletindo no preço pago pelo comprador. Entre as outras empresas nacionais com atuação relevante na exportação de gado vivo estão Mercúrio e Agroexport.

Para crescer, os empresários se movimentam para abrir novos mercados. Hoje, mais da metade das vendas brasileiras são para a Turquia. Missões comerciais, no entanto, já buscam clientes na Malásia e na Indonésia - dois países hoje atendidos sobretudo pela Austrália. A avaliação é que, se a estratégia der certo, as vendas de gado vivo podem crescer mais 50%, para 600 mil unidades por ano, até 2023.

Porém, entidades como o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal e a Agência de Notícias de Direitos dos Animais (Anda), que conseguiram suspender a venda de boi vivo por alguns dias, não estão dispostas a arredar pé da tentativa de paralisar o setor. “Nossa luta é pelo respeito aos animais, que não estão contemplados nas regras de exportação brasileiras, que se limitam a aspectos sanitários”, diz Vânia Plaza Nunes, médica veterinária e diretora técnica do Fórum Animal. A briga com os frigoríficos é de longo prazo. Segundo ela, novos recursos para voltar a paralisar as vendas de gado vivo serão apresentados nas próximas semanas.

“É uma atividade que não agrega valor para a economia e só beneficia poucos empresários”, diz Vânia. “A taxa de mortalidade é muito alta, de 10% de um total de 25 mil animais”, afirma.

Fonte ligada aos exportadores disse, no entanto, que esse índice de perdas na exportação simplesmente inviabilizaria o negócio e espantaria os compradores. E frisou que a média de mortes seria bem menor, da ordem de 0,1%. Ou seja: cerca de 25 bois, em uma carga de 25 mil, iriam a óbito durante o transporte de navio.

A Associação Brasileira dos Exportadores de Gado (Abeg) disse, em e-mail enviado à reportagem, que existe desinformação em relação à venda de gado vivo e reforçou a preocupação do setor com as condições dos animais durante o processo de exportação.

“O bem-estar animal faz parte da sustentabilidade da atividade. Um boi sem bem-estar causa prejuízos (ao vendedor)”, disse a entidade, referindo-se à noção de que o um animal sujeito a altos níveis de estresse pode resultar em produto final de qualidade menor.

Líder no segmento, a Minerva se pronunciou sobre as críticas de entidades ambientais por meio de nota. “O manejo do gado (de exportação) segue todos os procedimentos adequados para preservar o bem-estar dos animais durante o transporte, embarque e no decorrer da viagem até o destino”. A empresa também lembrou que a atividade é regulada pelo Ministério da Agricultura. Procurado, o ministério não concedeu entrevista.

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