E, no último dia - sexta, 2 -, vieram os melhores filmes do 44º Festival de Gramado. O nacional “Barata Ribeiro, 716” venceu a competição brasileira, ganhando os Kikitos de melhor filme e direção (Domingos de Oliveira). Não levou também o que seria o mais óbvio Kikito de todos - o de melhor ator para Caio Blat - porque o júri resolveu nos surpreender. Antes tivesse ficado no lugar-comum, premiando Blat e Gustavo Machado, o Ronaldo Bôscoli de “Elis”, mas os prêmios de melhor ator para Paulo Tiefenthaler (“O Roubo da Taça”) e melhor coadjuvante para o diretor de “El Mate” (Bruno Knott) avalizam a opção dos selecionadores por comédias. Nada contra o gênero, em si, talvez contra essas comédias, especificamente.
Mas a opção do júri nacional foi interessante. Concentrou os prêmios em metade dos filmes da seleção. “Barata Ribeiro”, sim - o filme recebeu também os Kikitos de melhor atriz coadjuvante e trilha -, “O Roubo da Taça” e “El Mate”. “O Silêncio do Céu”, de Marco Dutra, preferido da crítica, ganhou o especial do júri. “Elis”, de Hugo Prata, Kikito de melhor filme do público, ganhou melhor montagem e atriz, a extraordinária Andréia Horta. Só um golpe do júri teria tirado dela o troféu. Na competição latina, outro júri optou por dividir os prêmios - melhor filme (e ator) para o paraguaio “Guaraní”, de Luis Zorraquín, e melhor diretor para o chileno Fernando Lavanderos, que também levou o prêmio da crítica.
Belo como é o filme paraguaio - sobre a viagem de um avô com sua neta, atravessando o Paraguai rumo a Buenos Aires -, “Sin Norte” talvez tenha sido o melhor filme de todo o festival.
Outra viagem, a de um homem que parte para o Norte do Chile em busca da mulher, que o abandonou. Por quê? Ele segue seus passos. Dessa relação moribunda, descobre um país devastado, paisagens desoladas (as geográficas e as humanas). Chega a um dolorido encontro consigo mesmo. O júri atribuiu o prêmio de melhor atriz à codiretora de “Las Toninas Van al Este”, Verônica Perrotta, e o especial ao argentino-brasileiro “Esteros”, de Papu Curotto, que também recebeu o Kikito de melhor filme do júri popular.
Ao longo de oito dias, desde a sexta (2), o festival foi marcado por manifestações de repúdio ao governo agora efetivo. “Fora, Temer” foi a palavra de ordem mais ouvida no palco do Palácio dos Festivais e, no encerramento, na noite de sábado houve uma manifestação em bloco dos curtas-metragistas. Justamente, os curtas.
Considerada como um todo, mesmo na sua diversidade, foi uma seleção muito boa e rigorosa. Mais que qualquer longa - o de Domingos, sobre a juventude pré-golpe civil-militar de 1964, pode ser também sobre a juventude atual -, os curtas espelharam a crise brasileira. Trouxeram a voz da periferia, das mulheres trans, dos quilombolas. Uma seleção forte. O júri premiou um curta cativante - o brasiliense “Rosinha”, de Gui Campos. A crítica, visionariamente, premiou “Lúcida”, de Fábio Rodrigo e Caroline Neves. Se fosse preciso escolher um filme para sintetizar todo o festival de 2016, seria o curta da periferia.
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