A habilidade de Steven Spielberg para contar uma história é indiscutível, há pelo menos quatro décadas.
Experimente dar a ele um roteiro com timing perfeito e diálogos inteligentes escrito por seis mãos pesadas: o incensado dramaturgo inglês Matt Charman e os irmãos Joel e Ethan Cohen.
Se esse roteiro for esculpido a partir de uma história real de um dos períodos mais “cinematografáveis” da História – A Guerra Fria –, a chance é alta de termos grande cinema.
A equação deu certo. É exatamente o que temos em “Ponte de Espiões”, o novo thriller do diretor de “E.T.” e “A Lista de Schindler” que estreia nesta quinta-feira (22) nos cinemas.
Guia
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Ainda que, como de costume, Spielberg abuse do açúcar e transforme uma trama centrada no paranoico jogo de xadrez entre EUA e URSS , num conto otimista com lição de moral em defesa das instituições familiares e do american way of life.
Como ele é Spielberg você pode ou desprezá-lo ou simplesmente relevar como se faz com amigos com velhas manias e aproveitar o que ele faz como ninguém: envolventes filme de aventura.
Essa é a quarta colaboração do diretor com Tom Hanks, agora no papel do James Donovan, um personagem real de trajetória inacreditável.
No roteiro, Donovan é um advogado especializado em seguros que recebe um convite “que não pode recusar”: defender um espião soviético Rudolf Abel (Mark Rylance), preso pela CIA.
Defender, mas não muito. Apenas para deixar claro que mesmo os inimigos merecem o “devido processo legal” da corte americana. Como Donovan leva seu trabalho a sério, o julgamento surpreende a opinião pública americana – louca para enforcar o comunista.
Méritos
“Ponte de Espiões” tem o mérito das elegantes reconstituições de Nova York e Berlim na década de 1960 e também um ótimo elenco de apoio. Preste atenção no cinismo das atuações de agentes dos Estados em tempo de paz armada, combustível para diálogos antológicos no roteiro mais comportado da carreira dos irmãos Coen.
Quando o piloto de uma missão secreta americana é preso na Rússia, o advogado se torna o principal negociador de uma possível troca entre os presos, numa trama que envolve também o serviço secreto da República Democrática da Alemanha (a Alemanha Oriental) em plena construção do muro que dividiu Berlim de leste a oeste.
Donovan foi mesmo o conciliador nessa questão – ainda que o filme romantize um tanto sua atuação. Mas fez mais: foi assessor da acusação do julgamento dos nazistas em Nuremberg depois da Segunda Guerra e negociou pessoalmente a paz após o episódio da fracassada invasão americana a Cuba em 1963, na Baía dos Porcos, momento que muitos historiadores reputam como o mais tenso da Guerra fria.
Hanks (que não é meu ator preferido) brilha na pele do homem de retórica e sensibilidade política afiada. Alguns dos grandes momentos do filme são as cenas em que seu personagem contracena com Rylance. Muitas delas prontas para o clipe da cerimônia do Oscar a que ambos devem concorrer.
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