Composições delicadas e doloridas. Dores expurgadas em formato de canções suaves, dolentes, cativantes, algo ingênuas. O álbum Então Morramos é o novo trabalho da banda Simonami e está à disposição de quem chegar ao site do grupo: simonami.art.br . Canções orgânicas, acústicas, que misturam amor e dor. A maioria cantada por uma voz sem igual, uma das mais interessantes do Brasil atual, a de Lilian Soares.
A ela pedi que me explicasse o disco. Muitas vezes, o artista cria, sem saber muito bem explicar o que criou. Simplesmente faz e parece um processo tão fácil que chega a dar inveja. Quando insisto, eles têm de se debruçar racionalmente sobre o que criaram e revelam-se para nós e para eles mesmos.
Eis alguns trechos do depoimento-reflexão de Lilian Soares sobre Então Morramos, da Simonami, que teve a produção de Vinícius Nisi:
O álbum
"Juntamos todas as nossas frustrações e angústias pra jogar na cara de todo mundo. Eu tenho a sensação de que era mais ou menos isso o que a gente queria dizer no primeiro trabalho mas faltaram palavras, memórias, sei lá o quê.
Soledad, Ampulheta, Fantasma, Pedido ao Pássaro, Janela, Irmã, são alguma ressignificação das nossas vidas. De todo tipo de dor, das solidões que vivemos, das mágoas, das mortes que vivemos, e de como em família (que é como a gente se considera) vivemos todas essas coisas.
É um retrato do nosso estômago, das nossas entranhas. Queremos muito que essa dor alcance um planeta inteiro. Para desordenar algumas coisas e reordenar outras. Talvez esse seja um dos atributos da obra de arte."
Os donos de cada "poema":
"Soledad, Janela, Irmã, Sin Premura são da Lay, a quem a gente adere sempre mais. Ela está longe, em Londrina, escreve como ninguém. É uma forma de a gente preencher esse vazio da falta dela aqui em Curitiba e de dar voz pra tudo o que ela tem pra dizer.
Coisas da Escolinha e Ampulheta são do Shan. Ampulheta nasceu enquanto o Então Morramos ia acontecendo. Coisas da Escolinha estava entre a gente há tempos e tinha virado tão xodó que resolvemos colocar no conglomerado também!
Fantasma e Pedido ao Pássaro Jean escreveu. Toda a banda considera a Pedido ao Pássaro a melhor coisa que ele já escreveu na vida. Somos apaixonados pelo refrão.
E eu escrevi nós-um pra ele, hehe. A gente fez juntos, na verdade, porque eu sou muito ruim de violão. Escrevemos pro nosso tal save de date do casamento (casamos em abril desse ano)."
Vinícius Nisi e a produção
"Nasceu um carinho muito grande pelo Vinícius durante a gravação. Ele fez tudo com um empenho sem tamanho. Abriu a nossa cabeça e os nossos corações pra tirar as nossas referências de lá e nos entender.
Ele passou horas ouvindo Bon Iver, Sean Carey, Fleet Foxes, novidades que a gente jogou na cara dele, ahahahha. Aí ele nos entendeu.
Pedimos pelo amor de Deus pra não gravar do jeito convencional, sabe? aquele em que se grava primeiro a voz, depois a percussão, depois os violões, um por vez, com metrônomo?
O Nisi acolheu e deu vida pra ideia maluca de montar 10 microfones de estúdio todos juntos e gravar a gente tudo junto ao mesmo tempo. Uma ou outra coisa foi gravada depois, mas só os microdetalhes, tipo um sininho. Nossas vozes foram cantadas todas ao mesmo tempo. Acho que essa energia está aí."
Lo-fi
"Queríamos muito que as canções não ficassem plastificadas, corretíssimas, nítidas, acentuadas pelos programas de computador que corrigem coisas. Somos nós aí, nus e crus. O Nisi é um baita dum profissional, então ele usou os botões da pós-produção sem tirar isso da gente. Está sem artificialidades. Está essencialmente a gente.
Achei que o pessoal não fosse entender essa cara de gravado no quintal, o tal do lo-fi, mas acho que as pessoas andam com a sensibilidade ativada mesmo
Eu podia te contar o que motivou cada composição, mas em cada música mora um feitiço maluco que acontece quando a nossa história encontra a história de quem tá ouvindo e desmistificar isso seria um crime. A gente resolveu com votação em reunião que não ia mais explicar música pra não matar a imaginação de quem recebe as canções."