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Comprei para os netos umas espadas artesanais de madeira, mais para ajudar os índios que as vendiam. Pensava que os netos, neste tempo de jogos eletrônicos, não fossem se ligar nas espadas de madeira, e foi isso mesmo que aconteceu.

Ganharam as espadas – Legal, Vô! – e logo deixaram de lado, brincando de correr atrás dos cachorros, pular no nosso indestrutível sofá, encher o piso da sala de jogos de armar. Até que de tudo enjoaram, pegaram as espadas e, de repente, tornaram-se guerreiros!

Da boca do mais velho, do alto de seus cinco anos, brotou o grito de guerra: – Atacar!

O outro, com seus irremediáveis quatro anos e meio, espantou-se mas logo começou a imitar: – Atacar! – e tivemos cargas de cavalaria pela sala e em redor da casa.

(Desconfio que, como as meninas trazem no DNA o gosto por brincar de casinha, os meninos gostam de brincar de lutar. Mulheres seduzem, homens conquistam, desde a infância...)

Fui fã dos piratas de capa e espada do cinema, depois vi meus filhos ligados nos duelos de tecno-espadas em Guerra nas Estrelas, e de repente vejo meus netos usando as espadas como se fossem tacapes, dando bordoadas! Entro no meio da luta:

– Vocês estão querendo regredir, voltar ao tempo do cacete?!

O mais velho pergunta o que é regredir, e o menor se defende:

– Ele regredeu primeiro, vô!

Explico que espadas são armas nobres, para lutas bonitas entre cavalheiros, mas o menor abre os braços para falar:

– A gente não tem cavalo, vô!

Explico que, para ser cavalheiro, é preciso apenas ter sentimentos bons, coragem, altivez, e o maior fala olhando de cima o menor:

– Eu sou mais alto, viu?

O menor lhe dá uma espadada no lombo, e os dois cavalheiros voltam a se engalfinhar. Confisco as espadas e anuncio que, se continuarem brigando, não terão sorvete depois da janta. Eles olham as espadas como se fossem bichos mortos.

Pergunto se conhecem a espada mágica, os olhinhos brilham. Vou ao escritório, eles atrás, esquecidos das espadas de madeira. Sobre a estante de livros, pego minha velha espadinha de lata, com que menino lutei tantos duelos. Eles se entreolham ressabiados, como a dizer que deve ser brincadeira do vô, que mágica pode ter essa espadinha velha toda torta? Então conto, brandindo minha velha espadinha:

– Espada mágica é aquela que você usa com imaginação! Lutando contra o dragão! Contra o rei mau, ao lado do rei bom! Pra conquistar o castelo e libertar a princesa! É a espada que luta sem cansar e vence sem matar! É a espada má-gi-ca!

Deponho a arma preciosa, eles olhando sem piscar, até que o maior passa a mão na espada e sai correndo, dando golpes a torto e a direito, cavalgando um potro que saracoteia como só consegue um menino de cinco anos. O menor me olha já choramingoso:

– Ele pegou a espada mágica, vô!

Digo que cada um terá sua vez, e vamos atrás do cavalheiro, que também choraminga quando retomo a espada e dou ao menor. Este enfia a espada no cinto e fica posando diante do outro, que então pega as duas espadas de madeira. O menor reclama:

– Ele pegou duas, vô! – e parte para o ataque. Entro na batalha, pensando que não é fácil ser avô de dois cavalheiros com três espadas.

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