Cada um enxerga o que quer em um filme como A Árvore da Vida. Eu vi o poder do arrependimento e do perdão.
O longa de Terrence Malick tem polarizado as plateias por sua ousadia. Ele costura a história de uma família com cenas que aludem à criação do mundo, em uma constante oração questionadora. A profusão de silêncios e cortes secos para outras eras realmente pode incomodar.
No meu caso, achei as imagens lindas, mas poderia até abrir mão dos efeitos que aludem ao poder da lava, do mar e da criação para ter mais da profunda culpa que o garoto Jack fermenta ao longo da infância. O pai é duro. Não permite cotovelos nem conversas à mesa. Exige um cuidado impossível do quintal e que o filho cresça para ser seu próprio patrão. O resultado é que ele fica paralisado, sem saber se vai ou fica.
A rispidez contrasta com a graciosidade da mãe, que além de linda era bondosa. Quando o pai, vivido por Brad Pitt, sai em viagem, ela e os três filhos respiram aliviados e correm pela casa.
"Pai, mãe, vocês lutam dentro de mim", Jack lamenta.
Com tudo isso, ele crescia observando ao seu redor com um olhar de desconfiança. Por dentro, um remoer que denuncia a infelicidade. Como escolher quem ele seria? Bom ou mau? "Deus, por favor, me faça ser bom", ele reza. "Pode acontecer com qualquer pessoa?", ele questiona, ao ver bandidos sendo presos.
Nesse dilema pré-adolescente, ele transfere seu impulso autodestrutivo. Reza para que o pai morra, mas é o irmão quem ele cogita machucar. Quando finalmente age e cumpre o pior de seus pesadelos é que se abre o caminho para o perdão. "Eu não consigo fazer o que amo, mas faço o que odeio", diz, ressoando o apóstolo Paulo. A culpa é extravasada, e ele descobre a graça de se reatar, passar uma borracha. Aqui, confesso que crises entre irmãos sempre me fazem chorar no cinema.
Vi um documentário sobre a infância em que uma garotinha transferia à boneca seu nome e dizia, braba: "Ellen tem que ser castigada". A conclusão dos especialistas que a observaram horas a fio foi que ela clamava por limites, sem os quais seu pequeno mundo interior patinava, confuso.
Outro ponto que me pegou é o amor incondicional da esposa em A Árvore da Vida, interpretada por Jessica Chastain. Ela obviamente desaprova a rigidez do marido com os filhos, mas fica quieta. Quem hoje faria isso? Jack questiona durante todo o filme essa passividade, mas ela nunca responde. Uma das cenas mais lindas vem na sequência da única briga deflagrada na casa, em que no lugar de erguer a voz ela chora e esfrega um pano molhado no rosto do marido. "O que você acha disso, hem?"
Ele a segura, e a cumplicidade entre os dois apazigua a situação. Cada filho estava em um quarto, chorando.
Perdoar não é muito bem visto hoje em dia. Convém aos muito elevados ou aos muito humildes, deixando uma vasta margem da população agarrada em sua mágoa. Mas, como a personagem Júlia de Morde & Assopra ensinou à empregada Dulce: "Perdoar não é fraqueza". Quem sabe seja até sinal de força.
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