Por mais que façamos pose de descolados metafísicos na porta do teatro, é universal o tique da interpretação: todo mundo quer sair de um espetáculo lecionando sobre significantes e significados.
Prefiro aquela sensação de comoção interna que faz querer ficar sozinho, sem falar nada por uns tempos. Pena que sejam poucos esses momentos o que é natural, afinal, a obra-prima precisa de um caldo de boas obras médias para se destacar.
Quem falou muito bem sobre a obsessão pelo conteúdo nas artes foi a pensadora norte-americana Susan Sontag, morta em 2004. Um de seus primeiros artigos, sempre incisivos, provocadores, foi Against Interpretation, de 1964. Nele, ela rebobina até os gregos e identifica na definição de arte como representação do real (imitação, mimesis) a origem da separação entre forma e conteúdo com evidente vantagem para o último.
Com o modernismo, artistas deixam de lado a predileção pelo figurativo realista e a arte passa a aceitar expressões subjetivas. Mas, mesmo nas criações mais abstratas, a interpretação persiste: "O artista quis dizer..." era uma frase usada com frequência na década de 1960. Nada mudou.
Com ideias como essa, Sontag mostrou-se uma profeta capaz de compreender as transformações enquanto ainda estão ocorrendo o mais difícil dos trabalhos. Viu, por exemplo, na arte pop e abstrata uma fuga do artista para longe das interpretações fáceis, valorizando experiências com a forma.
Foi uma fuga bem feliz, transportando iniciativas das artes cênicas para uma seara mais interessante esteticamente o que não se pode dizer de muitos trabalhos hiper-realistas. Naquele mesmo período em que Susan previa o futuro com suas ideias, o encenador Robert Wilson, texano, iniciava sua escola de criação vanguardista. Os primeiros espetáculos estendiam o tempo, podendo durar semanas, ou ocupavam espaços móveis, como uma montanha no Irã.
Wilson não inventou rodas, mas caminhou em trilhas abertas por diretores autorais como Bertolt Brecht, Samuel Beckett e Antonin Artaud, que prezavam a forma.
E é na performance como a que ele investigou que se encontram os trabalhos que mais costumam espantar o público interpretativo. Talvez por isso, como provocação, a Bienal Internacional de Curitiba tenha começado em setembro com destaque para encenações individuais performáticas, para espanto de passantes da Rua XV e usuários de tubos de ônibus.
São criações situadas a meio caminho entre a arte visual e a dança contemporânea (e não é que os melhores trabalhos costumam ser aqueles impossíveis de rotular?).
Pensando nessas questões, a companhia curitibana Entretantas Conexão criou, em 2012, o espetáculo Swingnificado, que brinca justamente com a compreensão possível para seus movimentos. No "manifesto" publicado pelo grupo sobre o trabalho, afirmam: "Muitas vezes tivemos que lidar com a incessante e não menos engraçada e desconcertante pergunta feita após o espetáculo o que isso quer dizer?".
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