O Paraíso São os Outros é narrado por uma menina de uns 12 anos e, como crianças dessa idade costumam ser, o livro é de uma honestidade desconcertante. A história em 18 capítulos muito curtos é feita de pequenas digressões que essa narradora faz a respeito do amor.
A ideia para o livro surgiu enquanto Valter Hugo Mãe escrevia o romance A Desumanização. A certa altura, Halla, a jovem protagonista que perde a irmã gêmea, ouve de outro personagem: “O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou sua expectativa. Sem ninguém no presente nem no futuro, o indivíduo pensa tão sem razão quanto pensam os peixes. Dura pelo engenho que tiver e perece como um atributo indiferenciado do planeta. Perece como uma coisa qualquer”.
Ilustrações usam pedras sobre fotografias
Nino Cais é um artista plástico brasileiro com 45 anos e experiência. Exibiu seu trabalho em eventos importantes do país
Leia a matéria completaDá para imaginar que a narradora de O Paraíso São os Outros é então Halla, embora isso não seja escancarado e não faça diferença. Os livros estão ligados, mas são independentes.
Com uma simplicidade aparente, Mãe esconde observações geniais sobre a vida e as relações de afeto. “O amor precisa ser uma solução, não um problema. Toda a gente me diz: o amor é um problema. Tudo bem. Posso dizer de outro modo: o amor é um problema mas a pessoa amada precisa ser uma solução.”
Existe um detalhe: Mãe é um angolano radicado em Portugal. A menina narradora fala, pois, um português que às vezes soa ligeiramente estranho para um brasileiro: “A tristeza a gente respeita e, na primeira oportunidade, deita fora. É como algo descartável. Precisamos usar mas não é bom ficar guardada”.
Valter Hugo Mãe com ilustrações de Nino Cais. Cosac Naify, 32 pp., R$ 36,90.
Esses pequenos estranhamentos que o texto causa – “deita fora”, “estou a ser sincera” – fazem parte do encanto que ele tem.
O livro é classificado como literatura infantojuvenil. Suponho que o seja pela capacidade de falar também a jovens e não apenas para eles. O fato é que ele possui camadas – como a maioria dos livros bons – e você avança nessas camadas na medida em que for capaz de lidar com elas.
“As pessoas mais velhas, quando são um casal, dão beijos pequenos. As pessoas novas costumam dar beijos mais longos, cheios de paciência. Eu não tenho muita paciência. Devo ter a alma mais velha. Não sei.” Existe tanta informação nesse fragmento que você pode se demorar nele. Por que os mais velhos dão beijos pequenos? (E “pequenos” soa lindo.) Sabemos que não tem a ver só com a paciência e que isso pode significar mais. A descrição basta para criar uma imagem com chance de ficar muito tempo na cabeça de quem lê.
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