Os heróis e suas jornadas não são mais como costumavam ser. Esqueça a ideia do herói clássico que deixava a sua vila numa jornada arriscada em que com coragem e inteligência redimiria o povo para o qual retornaria consagrado.
Pelo menos no livro “Nossa Senhor D’Aqui”, o romance mais recente da escritora Luci Collin. No universo criado pela autora todos são heróis porque ninguém é herói. “[O livro] é uma epopeia falhada, de bolso. Os périplos não acontecem”, observa Luci.
O que ler
O Caderno G convidou Luci Collin para que entre as opções na Livraria Arte& Letra indicasse três livros que compraria
Leia a matéria completaAs jornadas dos personagens de Luci são curtas: até a janela, até a casa de um parente, até uma festa na cidade. Ou, como um dos personagens constata: “Se eu tivesse ido àquele café todos os dias teria encontrado o meu grande amor, mas meu chefe precisava de mim...”
Não por acaso a protagonista é uma avó imigrante, uma matriarca alemã (Frau Omerta) que, como já veio de longe, não vai mais para lugar nenhum. E no lugar do périplo heroico, a sabotagem que o destino e a realidade tramam cotidianamente contra todos.
Lançamento
Luci Collin, Arte & Letra, 156 pp. R$ 28. Romance
Falando sobre esta oma, e deixando que os personagens exponham suas visões tão diversas sobre ela, o texto de Luci fala de um jeito lírico e divertido de sua aldeia e da amálgama racial recente do Brasil, para tratar de algo muito maior: a vida estranha (e tragicômica) das pessoas comuns. E o faz com o texto fragmentado, justaposto e montado de uma forma que conta com a recepção de um leitor esperto e cúmplice para acontecer.
Pois, apesar de as histórias serem apresentadas em uma colagem enganosamente caótica, em dado momento o leitor reconhece aliviado a estrutura clássica do romance. Ainda que algumas tramas se depreendam do núcleo central no jogo proposto por Luci, dando a impressão de que cada história funcionaria por si só.
“Há menos linearidade no tratamento do que seria o real de nosso tempo. Sabemos pouco sobre as pessoas, não sabemos mais ler as pessoas com a facilidade que já tivemos”, afirma Luci.
Ela não é uma autora que tem saudade, que reclama da familiaridade que os leitores têm com mensagens rápidas, com fragmentos de narrativa, com construções aparentemente fora dos padrões. “Os escritores modernos que nós crescemos lendo tiveram que desbravar muitos caminhos. Nós, os pós-pós-modernos contamos com a velocidade da linguagem virtual como aliada. As coisas acontecem-nos em outro tempo”, diz.
Para quem, como Luci, foi taxada de hermética e difícil desde a estreia em 1984 (desde então são 14 livros), a mudança na forma de ler e se comunicar a favoreceu. “Quando eu comecei me falavam: porque você não simplifica? Eu respondia: porque eu escrevo assim. Lembro de um editor que me disse que isto não é literatura, está mal escrito”, se diverte. “De lá para cá eu não alterei minha maneira de escrever”.
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