| Foto: Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo

Jean Sibelius, o mais renomado compositor finlandês, nascido em 8 de dezembro de 1865, foi um compositor que em sua fase madura permaneceu completamente independente de qualquer corrente influente de sua época. Apesar de sua formação ter sido basicamente alemã e austríaca, não sentimos a presença de Wagner, Brahms, Mahler ou Schoenberg em suas composições. A escola francesa lhe causava tédio (dormiu satisfeito durante a execução dos Noturnos de Debussy) e não tinha nenhuma empatia com a arte de Igor Stravinsky.

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Era, portanto, um compositor absolutamente original. Conseguimos perceber alguma influencia do romantismo russo em suas primeiras obras (sobretudo na sua primeira sinfonia), mas estes traços característicos desaparecerão em breve. Num certo sentido Sibelius foi um compositor nacionalista, mas muitas vezes sem citar canções e ritmos folclóricos. A Finlândia está retratada em suas composições muito mais pela amplitude e pelas características de suas paisagens. O próprio compositor ao se referir à sua austera Quarta Sinfonia declarou que nela havia a essência da paisagem finlandesa: rochas, água, florestas, escuridão.

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Outro traço que podemos chamar de nacionalista na obra do compositor é a similaridade entre seus temas musicais e os acentos do vocabulário finlandês, onde há uma preponderância de palavras proparoxítonas. E, finalmente, seu comprometimento com a cultura finlandesa fica bem claro por sua utilização da Kalevala a epopeia nacional da Finlândia, compilada pelo escritor Elias Lönnrot no século XIX. Desta coletânea Sibelius tornará mundialmente conhecidos os mitos de Lemminkäinen , o herói que desafia a morte, Kullervo, o herói que comete involuntariamente um incesto e a belíssima lenda do nascimento do universo, Luonnotar.

Vale a pena lembrar também que Sibelius foi uma figura chave no movimento de independência de seu país, que até 1917 era atrelado ao império russo. Algumas de suas obras, como o poema sinfônico “Finlândia” e a Segunda Sinfonia, revelam esta faceta.

Obras primas

Existem algumas composições de Sibelius que se tornaram extremamente populares como o seu Concerto para violino e orquestra, o poema sinfônico “Finlândia” e suas duas primeiras sinfonias. No entanto as mais importantes e originais obras do autor são muito menos conhecidas. Para começar a sua única composição camerística de envergadura: O notável Quarteto de cordas “Voces intimae”.

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O maestro Osvaldo Colarusso escreve o blog Falando de Música.

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Entre suas magníficas sete sinfonias as de número 4 e 6 revelam um tipo de composição única e extremamente ousadas de um compositor maduro. Mas mesmo em suas primeiras composições encontramos obras notáveis como a “Suíte Lemminkäinen” e a Sinfonia Kullervo. “Luonnotar”, obra para soprano e orquestra, é talvez a obra máxima do autor. A já citada lenda da criação do mundo da mitologia finlandesa aparece aqui através de uma narrativa na voz do soprano ecoada por uma grande orquestra. Sua última obra prima, o poema sinfônico Tapiola, narra a destruição da natureza com cores rudes e ásperas.

O longo silêncio

Um dos enigmas do compositor Jean Sibelius é o seu silêncio de mais de 30 anos. Depois de compor sua original Sinfonia Nº 7 (em apenas um movimento!) em 1924 e seu poema sinfônico Tapiola em 1926, o compositor, que só viria a falecer em 1957, não compôs nenhuma outra obra. As razões deste silêncio são motivo de diversas suposições, desde o fato de não se adaptar às novas linguagens até o alcoolismo. Em sua velhice teve que suportar ataques violentos de músicos e pensadores que claramente não suportavam a popularidade de um compositor independente, para o qual nem o atonalismo e nem a irregularidade rítmica lhe despertavam interesse.

Em 1955, ano em que o compositor completava 90 anos de idade, o maestro e compositor francês René Leibowitz lançou um estudo em que afirmava que Sibelius “é sem dúvida o pior compositor do mundo”. Em 1938 o filósofo Theodor Adorno escreveu um ensaio onde afirmava que “se Sibelius é um bom compositor então não são válidas as qualidades dos compositores alemães desde Bach (passando por Beethoven e Brahms) até Schoenberg”. A morte de Sibelius revela outro traço marcante do artista. Ao ver um grupo de aves migratórias no céu percebeu que uma delas desfez o grupo. Por causa disso, confidenciou a sua mulher, acreditava que em breve morreria. Dois dias depois, com quase 92 anos, uma hemorragia cerebral causou sua morte. Faleceu em sua casa de campo, em meio a uma floresta finlandesa.

Ouvindo Sibelius
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Entre as incontáveis gravações das obras do compositor cito aquelas que julgo expoentes máximos entre os intérpretes de sua obra. O Concerto para violino e orquestra tem na leitura de Christian Ferras (Deutsche Grammophon) a referência absoluta. No caso de suas sinfonias podemos destacar diversos grandes intérpretes como Colin Davis, Osmo Vänskä, Simon Rattle e Leif Segerstam, mas os registros de Okko Kamu, sobretudo a recente integral de sinfonias lançado pelo selo BIS, são realmente superlativos. Okko Kamu é também o interprete de referência para a Suíte Leminkäinen (Deutsche Grammophon) e do Poema Sinfônico Tapiola (BIS). Luonnotar é extraordinariamente cantada por Gwyneth Jones (EMI) e Soile Isokoski (Ondine). O Quarteto de Sibelius é magnificamente interpretado pelo New Helsinki Quartet (Apex).