O cineasta paulista Daniel Ribeiro nunca imaginou que, com seu primeiro longa-metragem, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, pudesse chegar tão longe. A produção, que estreia nesta quinta-feira em circuito nacional, foi uma das maiores surpresas do Festival de Berlim, realizado em fevereiro na capital alemã (veja o serviço completo no Guia Gazeta do Povo). Selecionado para a Panorama, principal mostra paralela do evento, foi escolhido o melhor filme da competição pela Federação Internacional dos Críticos de Cinema (Fipresci) e ficou em segundo lugar entre os mais votados pelo público.
Também vencedor do prêmio Teddy, troféu concedido aos curtas e longas-metragens de todas as seções da Berlinale que tratam de temas relacionados à diversidade e à liberdade sexual, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho teve seus direitos de distribuição vendidos para 19 países e deve percorrer um longo circuito de festivais e mostras internacionais nos próximos meses.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Ribeiro, de 31 anos, conta que, embora tivesse percebido, nas exibições em Berlim, que o filme era visto com grande empatia pelo público do festival, ele não esperava uma recepção tão calorosa da crítica internacional, que acabou o transformando em um dos títulos mais comentados do festival.
Curta
Hoje Eu Quero Voltar Sozinho nasceu como uma ideia. "Eu sabia que queria fazer um filme sobre um adolescente cego que se descobre apaixonado por um amigo de escola."
Como não tinha recursos para a realização de um longa-metragem, Ribeiro conta que optou, a título de exercício, fazer um curta, Eu Não Quero Voltar Sozinho, lançado em 2010. Os elementos fundamentais da trama já estavam lá.
Leonardo (Ghilherme Lobo) é um adolescente cego da classe média paulistana, que frequenta um colégio particular, onde passa grande parte do tempo em companhia de Giovana (Tess Amorim), sua melhor amiga, que o acompanha todos os dias até em casa. A relação entre eles é ambígua, entre o afeto fraterno e algo mais.
A rotina da dupla se altera com a chegada de um aluno novo, Gabriel (Fabio Audi), que faz a dupla se tonar um trio e conquista o interesse tanto de Leonardo quanto de Giovana, chegando a provocar um estremecimento entre os velhos amigos.
Com essa premissa, que é a mesma do longa-metragem, o curta de Ribeiro percorreu o mundo, ganhou vários prêmios dentro e fora do Brasil e, mais importante, se tornou um grande sucesso na internet, com mais de 3,2 milhões de visualizações. "Essa repercussão me deu certeza de que tinha uma boa história e o elenco certo, com uma enorme química, que eu não poderia perder de jeito algum."
No elenco, todo muito afinado, o destaque fica por conta da impressionante atuação de Ghilherme, que tinha apenas 14 anos quando foi escolhido para o papel de Leonardo.
Vindo de uma família de artistas, o jovem ator, hoje com 19 anos, já chegou ao set do curta intuitivamente sabendo o que pretendia fazer com o personagem. "Ele já veio com o olhar do Leo, e eu apenas fui, de certa forma, moldando a sua atuação ao longo do processo todo", conta o diretor. "Ele também é dançarino e canta. Já tinha, desde novo, experiência em teatro musical, em montagens como A Noviça Rebelde e A Bela e a Fera."
Sutileza
Aparentemente simples, mas construído com extrema delicadeza e sensibilidade, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho é, acima de tudo, um filme sobre o universo dos afetos, que fala de família, amizade e do despertar para o amor de um garoto que não enxerga e teme, por isso, nunca ser capaz de atrair ninguém, suscitar mais do que piedade.
Ribeiro diz acreditar que, embora haja uma sensualidade latente que permeia a história, tudo é apresentado de maneira muito sutil, sugerido, sem o objetivo de afrontar, mas de sensibilizar. "Eu quis fazer um filme que falasse sobre uma experiência com a qual o público, não importa a idade ou a orientação sexual, pudesse se identificar."
Os vínculos entre Leonardo, Gabriel e Giovana vão se desenhando com a fluidez da vida real, em diálogos e situações que em momento algum soam artificiais, e que emocionam, justamente, porque são capazes de fazer qualquer um pensar sobre como é especial, ainda que por vezes dolorosa, essa fase de autodescobertas.
Não falta a Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, contudo, tensão. Representada pelo duplo preconceito enfrentado por Leonardo em sua jornada, Ribeiro prefere não supervalorizá-los, os tratando como percalços inevitáveis, enfrentados por todo adolescente. Sem jamais recorrer a um discurso panfletário, o jovem cineasta vence o enorme desafio de, por meio de uma trama muito bem narrada, com personagens complexos e tridimensionais, fazer um filme cuja razão de ser está em cada imagem, fala e olhar visto na tela.
Escolhida a dedo por Ribeiro para embalar sua história, a canção "Theres Too Much Love", da banda escocesa Belle & Sebastian, sintetiza em seu refrão todo o sentimento que Hoje Eu Quero Voltar Sozinho evoca: "Eu não posso esconder meus sentimentos de você agora/ Há muito amor ao nosso redor nos dias de hoje". GGGG
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