O clown de Marcel Gritten oferece “instruções para chorar.”| Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo

Durante a semana que passou você pode ter se deparado com alguém fantasiado dentro do ônibus. Se fingiu que não viu, perdeu o espetáculo “Perca o Ponto Mas Não Perca a História”, projeto de Rafael Camargo que reúne 15 atores e atrizes e acontece até 10 de agosto. Cada um desenvolveu um personagem ao longo de um período de preparo, mas pode-se dizer que a coisa começou mesmo na última segunda-feira (20), quando embarcaram nos primeiros coletivos no Terminal do Cabral.

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Ruim no “ensardinhado”, pior sem ele

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“Queremos levar um pouco de realismo fantástico, do lúdico para um lugar massacrante”, contou Camargo quando a reportagem se preparava para embarcar junto com parte do elenco na estreia.

Veja imagens da apresentação no ônibus

Algumas das propostas são mais provocativas, envolvendo a abordagem de passageiros. Outros querem surpreender só com sua presença, um pouco de fantasia no cotidiano.

 

Maurício Vogue criou um pequeno palco que leva ao pescoço, à maneira de um realejo. Quem se arrisca a chegar perto pode colocar a mão através da cortininha e tirar um poema, que ele lê para o felizardo. Giovana de Liz também homenageia uma poeta, Adélia Prado, no piquenique que realiza no petit-pavê dos terminais, durante o qual entrega fatias de bolo enquanto declama versos.

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Qual o propósito disso tudo?

Nilson dos Santos, porteiro.

A bordo dos vermelhões, a empolgação maior é das crianças, que reclamam quando o palhaço se afasta para outros gomos do biarticulado. Stephannye Lara Cândido Costa, 8 anos, aprendeu a ler aos 6 e já fez uso dessa habilidade para decodificar a performance do clown de Marcel Gritten. “Instruções para chorar: concentre o pensamento em você mesmo. Emita um som estridente, lágrimas e muco.”

Gostei do palhaço!

Stephannye Costa, 8 anos, ao lado da mãe.

Atores dividem causos com passageiros

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A resistência e o desprezo duram pouco em alguns casos. Em outros, é melhor desistir. Normalmente as pessoas não gostam de teatro interativo, e dentro do coletivo em movimento tem-se ainda a sensação de não ter para onde fugir.

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A coleta de feedback entre as “vítimas” dos atores exige persistência também. É com dificuldade que mudamos de papel, de viajante entediado para espectador/entrevistado interessado. “O que você achou de um palhaço sentar do seu lado?”, questiono a uma senhora. “Sei lá.” Tento com outra pessoa: “O que acha de uma ação dessas?” “É bom né...pra distrair.”

O que achei? Achei bom para descontrair

Juliane Sampaio, advogada.

Maria não quis tirar foto, mas aceitou que Marcel desenhasse sua “caricatura”. Abriu-se toda em sorrisos à ordem do desenhista, e mais ainda ao receber a folha de caderno de presente: era o rabisco de um boneco de palitinhos. Sim, ela já foi ao teatro, mas era “desses que fazem rir, só que sem palhaço”.

“Facinho”

Tem gente mais facinha de conversa. É atrás de mulheres assim que a atriz Pagu Leal tem ido em suas rotas até o Centro desde que se mudou para Piraquara. Mesmo antes de aderir ao “Perca o Ponto”, ela fazia um projeto pessoal no busão. A performance colaborativa envolve sentar-se ao lado de alguma trabalhadora e ir puxando conversa. Sempre tem alguém que dá trela. E apesar de não se considerar militante feminista, foi inevitável ir pelo caminho do gênero. “Elas me falam de muitos maus tratos, e sempre tem homem envolvido”, conta Pagu.

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