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Amor incondicional ou puro abuso? A pesquisa sobre endividamento de idosos, retratada no do­­mingo em reportagem de Ale­­xandre Costa Nascimento, aqui na Gazeta, revela uma vulnerabilidade a mais para as pessoas da terceira idade. Para quem não viu, vale contar: um levantamento do instituto Paraná Pesquisas feita para o jornal mostrou que 30% dos idosos de Curitiba têm dívidas com cartão de crédito ou empréstimo consignado. E, dos que devem, um terço compromete mais de 30% da renda mensal com as parcelas – o porcentual é tido como um limite de segurança para evitar a inadimplência.

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Não bastassem os problemas de saúde e a dificuldade de locomoção que afetam muitos, eles também estão financeiramente vulneráveis. Frequentemente, por causa de filhos e netos que lhes pedem dinheiro emprestado. Eles não negam – e quem negaria? Uma das grandes alegrias de ser avô (pelo que me dizem, ainda falta um tempo para eu chegar lá) não é justamente poder mimar e presentear os descendentes? O problema é que essa prática inverte a expectativa da população nessa faixa etária, que costuma contar com o suporte da família, e não sustentá-la.

Essa, por sinal, é uma característica cultural presente nos brasileiros e em outros povos latino-americanos: a expectativa de que os filhos serão responsáveis pelos pais quando estes chegarem à velhice. A verdade é que os filhos têm, realmente, uma responsabilidade com o cuidado dos mais velhos. À medida que a idade avança e a saúde se torna frágil, eles precisam ter alguém confiável por perto. Esse dever é uma forma de demonstrar amor, respeito, carinho.

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Um erro muito comum é confundir essa responsabilidade com o sustento financeiro. Não vou me estender nisso, até porque não estudei, de fato, o assunto, mas talvez haja uma justificativa histórica para isso. À falta de um sistema previdenciário que fosse capaz de atender à massa da população – principalmente da população rural, já que o Brasil só se tornou de verdade um país urbano nos anos 70 –, era natural que o idoso fosse financeiramente dependente dos filhos. Não parece ser o caso hoje em dia.

Atualmente, a previdência social provê uma renda mínima para os aposentados. Muitos a complementam com seu próprio trabalho, outros têm algum tipo de poupança, e tudo isso é muito bom. A experiência mostra que autoestima da pessoa idosa é reforçada quando ela possui certo grau de autonomia financeira.

O problema é que há um problema grave de educação financeira no país. Temos uma geração inteira que não aprendeu a lidar com dinheiro e que se afundou em dívidas. Os avós não conseguem assistir a isso, eles querem ajudar – e acabam por endividar-se também. Com isso, correm riscos, porque há sempre a possibilidade de terem gastos adicionais e imprevistos com a saúde. Remédios custam caro, exames também. O empréstimo para a família, então, pode resultar em dor de cabeça.

Hoje em dia é muito comum ouvir pais orgulhosos contando que estão fazendo investimentos em nome de suas crianças de um, dois anos de idade. É um presente para as crianças, e ninguém irá condená-los por isso. Mas é importante também que eles invistam no seu próprio futuro, para não depender dos recursos dos filhos. Quem pode imaginar quais crises financeiras eles não irão viver nos próximos 50 anos?

O melhor que você pode fazer pelos seus filhos é cuidar do seu próprio futuro financeiro. Melhor não passar a conta para eles.

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Patrimônio intangível

Outras nacionalidades nem sempre têm a mesma visão de cooperação entre as gerações que temos por aqui. Em lugares como os Estados Unidos, por exemplo, isso é raro. Lá, o costume é os mais jovens abandonarem o ninho no tempo da faculdade e atravessarem o país em busca de sonhos, ambições e salário (não necessariamente nessa ordem).

Mas o jeito brasileiro de ser tem muitos aspectos positivos. Ele mantém a coesão da família, por exemplo. No Brasil, as reuniões familiares de domingo, alimentadas por porções generosas de macarrão e frango servidas em torno dos membros mais velhos da família, são uma instituição nacional. Efeito disso é que também a sabedoria acumulada dos mais velhos está sempre acessível. É possível ouvir as histórias de antigamente, recordar os fatos que marcaram a trajetória da família ou pedir conselhos, sem ter de pegar um avião para isso. Recorremos a esse patrimônio intangível com muito menos frequência do que deveríamos.

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