Ontem fez exatamente três anos que expirou o primeiro prazo para averbação da reserva legal das propriedades rurais em todo o Brasil, inicialmente previsto para 11 de dezembro 2009. Desde então, foram três anos de muita, mas muita discussão, polêmicas e embates motivados por ideologias políticas, paixões e razões que definiram como opostos produtores e ambientalistas. Contudo, apesar do intenso debate, estamos prestes a encerrar mais um ano sem nenhuma solução e, provavelmente, com uma nova prorrogação.
A presidente Dilma Rousseff pode assinar hoje um novo decreto e postergar, pela quarta vez, o prazo de averbação, obrigação passível de enquadramento na lei de crimes ambientais. Essa, na verdade, é a hipótese mais provável. Isso porque não está descartada a possibilidade, ainda que remota, de a matéria voltar ao plenário da Câmara dos Deputados antes do recesso parlamentar que, na teoria, tem início na próxima semana.
Não editar um novo decreto e instituir um novo prazo significa deixar o produtor à mercê da fiscalização ambiental. Por outro lado, não definir de imediato a prorrogação também pode ser uma forma de pressão, num cenário que de certa forma obriga os deputados a levar o assunto ao plenário e liquidar logo a fatura. Para isso acontecer, porém, será preciso que um importante e respeitado articulador chame a responsabilidade para si, porque parlamentares e partidos não estão se entendendo no que diz respeito às mudanças no projeto de lei que foram promovidas pelo Senado, motivo pelo qual a discussão volta para a Câmara antes de seguir para sanção presidencial.
A matéria enfrenta, inclusive, divergências entre integrantes da mesma bancada, como é o caso dos ruralistas, que estão divididos entre os que aceitam as alterações do Senado como forma de ganhar tempo e aqueles que querem reabrir discussões, eliminando as chances de levar o assunto ao plenário ainda em 2011. Uma espécie de fogo amigo, a priori com justificativas técnicas, mas que sugerem interesses outros, alheios a questões da opinião pública e quase que de honra para concluir as votações.
De qualquer forma, apesar da grande chance de não haver um encaminhamento mais prático, isso não significa que o debate não tenha evoluído. Foram inúmeros estudos, consultas e audiências públicas Brasil afora. Se a matéria venceu as comissões da Câmara e do Senado e volta agora para nova apreciação dos deputados é porque houve avanços e falta pouco para seguir ao Planalto, que não deve oferecer resistência até porque acompanhou e, de certa forma, através das bancadas de apoio ao governo, influenciou a condução do processo.
Esse, aliás, é outro risco que precisa ser avaliado. Não seria o próprio governo o maior interessado em empurrar a definição para o ano que vem? Uma posição que isentaria o Executivo de tomar uma decisão que ainda não é consenso entre os deputados. No mínimo confortável, sem pressão ou indisposições. Mas também sem definição e com um grande desgaste.
Tomara que não. Mas no final da reta parece que o novo Código Florestal deixa de ser prioridade. E não foi por falta de mobilização. Com exceção das denúncias de corrupção e outras irregularidades nos ministérios, neste ano a legislação ambiental foi um dos temas de maior relevância e expressão na Capital Federal.
Envolveu muita gente, demandou muitos recursos, públicos e privados, e foi priorizado em detrimento de outras pautas, tão importantes quanto na definição de políticas públicas de caráter socioeconômico ou ambiental do país. A não votação do Código Florestal pode criar na sociedade a sensação de que tudo foi em vão, de que o ano foi perdido. Um sentimento tão forte quanto a impunidade.
O setor produtivo, mais do que o ambientalista, pressiona e ainda mantém as esperanças de votação para este ano. Os produtores e suas entidades de representação seguem apreensivos, a depender agora de uma definição que pode vir a qualquer momento do Palácio do Planalto, com o decreto que prorroga a averbação da reserva legal. Ou então do resultado de mais uma audiência pública, a derradeira, prevista para ocorrer amanhã na Comissão de Agricultura da Câmara Federal.
A audiência é convocada ou liderada pelo deputado Ronaldo Caiado, um dos nomes que defende uma discussão mais profunda e detalhada em cima das mudanças promovidas no projeto quando no Senado. Ou seja, pelo menos até a semana passada, e nas entrelinhas, o parlamentar sugeria que a última votação do novo Código Florestal Brasileiro ficará mesmo para o próximo ano. Mas como em Brasília tudo pode mudar, e muito rápido, é ficar atento para as definições que vão ocorrer entre hoje e amanhã.
Para constar, estima-se que um terço das propriedades rurais do estado estão com suas áreas averbadas. O número de imóveis que preservam a reserva legal, no entanto, seria maior. Muitos proprietários ainda não encaminharam o processo administrativo porque, uma vez averbada, não será mais possível modificar a destinação dessa área. E por conta da falta de definição e entendimento na discussão sobre a legislação, o produtor nunca se sentiu seguro para concluir o procedimento legal de averbação.
O porcentual de destinação da área para reserva legal é igual a 20% no Paraná, 35% no Cerrado e 80% na Amazônia Legal.