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Risco

Como as famílias vão pagar pelo rebaixamento do Brasil

Pão deve subir mais com a pressão sobre a cotação do dólar, já que parte do trigo usado no Brasil é importada. | Hugo Harada/Gazeta do Povo
Pão deve subir mais com a pressão sobre a cotação do dólar, já que parte do trigo usado no Brasil é importada. (Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo)

O corte da nota de crédito do Brasil – que agora não tem o selo de bom pagador da agência de risco Standard & Poor’s – é má notícia não só para o governo e grandes investidores, mas também para o consumidor. Para economistas, a perda do chamado grau de investimento deve agravar aspectos da crise que pesam mais no dia a dia das famílias: inflação e desemprego.

Os analistas são unânimes ao citar a alta do dólar como efeito imediato do rebaixamento do país. Com menos credibilidade, o Brasil deixa de ser atraente a fundos internacionais que, consequentemente, deixam de fazer investimentos aqui. A escassez da moeda americana em circulação leva a um aumento da taxa de câmbio. Na ponta dessa cadeia, está o encarecimento de produtos importados ou fabricados com matérias-primas vindas de outros países.

O preço do pãozinho, por exemplo, dependente do trigo importado, já subiu 8,1% de janeiro até agosto, segundo números do IPCA divulgados nesta quinta-feira pelo IBGE. A alta é maior que a registrada no mesmo período do ano passado, quando o produto ficou 5,43% mais caro. O mesmo ocorre com o automóvel, que subiu 5,59% até agosto, o dobro da taxa do ano passado (2,78%).

Por essa e outras razões, o carro foi cortado dos planos do advogado Heleno Sotelino. Ele queria comprar um modelo novo ainda em 2015, mas mudou de ideia. Diz que perdeu seu poder de compra por causa da alta generalizada dos preços. Como todo brasileiro, sente o peso da energia, que já subiu 47,33% este ano. “O dinheiro já está faltando. O mês está ficando cada vez maior”, contou ele, enquanto pagava as contas de luz e telefone em uma casa lotérica.

Já para a advogada Luciana Martins, o impacto do dólar mais caro é direto: ela pensava em viajar para a Europa no fim do ano, mas mudou de ideia. Ontem, a moeda americana vendida a turistas chegava a custar R$ 4,30 nas casas de câmbio, enquanto o euro saía por R$ 4,87. “Minhas férias estavam planejadas para o fim de novembro e suspendi. Quem sabe no próximo ano, porque agora, com o dólar e o euro tão altos, não tem como viajar.”

Para Fabio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), esse cenário que deve persistir. “A taxa de câmbio, que já vinha se ajustando para cima, hoje subiu um pouco mais. Isso afeta não só as pessoas que estão pensando em viajar para o exterior, mas também as que vão consumir pão, eletrônicos.”

Juros

André Biancarelli, professor do Instituto de Economia da Unicamp, diz que o dólar deve atingir patamares inéditos, mas pondera que a trajetória de alta já vinha se delineando há um tempo. Por isso, os preços e a inflação já sofreram os maiores efeitos. Para ele, só uma pequena parte da população deve ser afetada de forma direta, já que a maioria não possui ativos financeiros ou papéis na bolsa:

“Depende de como a coisa vai se encaminhar. Se mais uma agência colocar o país abaixo do grau, uma série de fundos não vai poder aplicar nos papéis brasileiros. Podemos perder acesso a uma fonte mais estável de investimentos e isso pode prejudicar investimentos em infraestrutura. Por outro lado, o Brasil está barato para os estrangeiros”, diz.

A queda no consumo também está associada à forte alta de juros dos últimos meses. Usados para conter a inflação - pois inibem as compras -, os juros podem ter as taxas elevadas na esteira do rebaixamento, para amenizar o efeito do dólar. Além disso, com a perda do selo, o país se torna menos seguro e, para atrair investidores, precisa oferecer juros maiores.

Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), os juros médios ao consumidor estavam em 126,74% ao ano em julho. A taxa do cartão de crédito era de 334,84% ao ano.

A alta no custo de vida é a principal queixa do angolano Ricardo Capemba Francisco, que vive no Brasil há 16 anos. “Há quatro anos estava bom. Quando a Dilma ganhou o segundo mandato, todas as coisas subiram muito. Precisei reduzir o plano de assinatura da internet e conversei com o proprietário do imóvel para fazer um desconto no aluguel”, conta.

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