Além de torcer para que continue chovendo, o governo federal conta com a queda no consumo de energia e o incentivo ao uso de geradores para evitar um racionamento neste ano. Para boa parte dos especialistas, no entanto, o país já deveria estar racionando energia e, na prática, o Executivo está apenas adiando o problema para 2016.
A própria confirmação das expectativas do governo teria efeitos colaterais. Isso porque a queda no consumo depende, em parte, da continuidade da crise econômica; e porque, quanto mais os shoppings e a indústria acionarem seus geradores para ajudar o sistema, mais cara ficará a fatura para o consumidor.
A aposta em uma moderação da demanda foi abordada, em diferentes ocasiões nas últimas semanas, pelo ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, e pelo diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp. Braga disse acreditar em uma queda de 3% a 5% no consumo de energia em relação a 2014. Chipp, por sua vez, avisou que as projeções do operador, inicialmente de um aumento de 3,2% na demanda em 2015, devem ser revistas para uma expansão de apenas 0,2%. Segundo o ONS, a carga de energia – consumo mais perdas – em janeiro ficou 0,2% abaixo da verificada um ano antes. Em fevereiro, a queda foi de 5,7%. Nos primeiros 22 dias de março, a carga baixou 0,1%, também na comparação com igual período de 2014.
O discurso oficial é de que o “realismo tarifário” – traduzido, no Paraná, em um aumento extraordinário de 32% na conta de luz residencial neste mês – e as campanhas publicitárias preparadas pelo governo vão conter o gasto de energia. Mas a crise econômica, e seu impacto sobre a produção industrial, também age para limitar o consumo. Aliás, já agiu neste primeiro trimestre, junto com o verão um pouco mais ameno.
O ONS tem dito que, se os reservatórios do subsistema Sudeste/Centro-Oeste chegarem ao fim de abril ocupando pouco mais de 30% da capacidade, o país conseguirá atravessar o chamado “período seco” e chegar a novembro com um armazenamento de 10% do máximo. Nesta segunda-feira (23), os lagos desse subsistema subiram a 26%. Chama atenção que o operador ache aceitável essa hipótese, uma vez que o nível de 10% é considerado o mínimo dos mínimos – muitas hidrelétricas já não operam nesse patamar.
Projeção perigosa
“Se tivermos um inverno um pouco mais chuvoso, acho que chegamos sem racionamento ao período úmido, de novembro em diante. Agora, se o próximo período úmido for igual a este que está acabando, aí ninguém escapa”, diz Walfrido Avila, presidente da comercializadora Trade Energy, de Curitiba.
Robson Luiz Rossetin, diretor presidente da Electra Energy, outra comercializadora curitibana, lembra que o país já atingiu os requisitos técnicos para um racionamento. “O Custo Marginal de Operação [CMO, que reflete o custo de cada megawatt adicionado ao sistema] já passou de R$ 1,4 mil por megawatt-hora, que é o chamado primeiro patamar de déficit, um indicativo da necessidade de racionar”, explica.