A Bolívia assumiu o controle pleno da produção interna, da comercialização e da exportação de petróleo e gás nesta quarta-feira (2), às 7h (horário de Brasília), com a entrada em vigor de novos contratos com as multinacionais do setor.
A nacionalização põe em prática os efeitos do decreto de retomada das instalações de petróleo e gás assinado em outubro de 2006.
Para simbolizar a nova fase, haverá o desligamento da produção, que será retomada logo depois - a YPFB afirma que as exportações de gás natural para o Brasil não serão afetadas pela interrupção simbólica.
O presidente Evo Morales anunciou as nacionalizações em discurso feito em praça pública no 1º de Maio - ele afirmou que, além do setor de petróleo e gás, as medidas também afetarão o setor de telefonia - com a nacionalização de uma companhia administrada pela Telecom Italia - e a criação de um banco de fomento no estilo do BNDES.
Petrobras
O Brasil ainda não sabe quanto vai receber pelas duas refinarias da Petrobras, que foram tomadas pelo governo da Bolívia. Neste momento, os dois países disputam uma queda de braço.
Do lado brasileiro, está a busca por um fornecimento de gás constante e a preço justo. Para o governo brasileiro, as negociações seguem. Do lado boliviano, a questão econômica existe, mas o efeito político para o público interno é que estaria pesando mais.
A Petrobras diz que a decisão da Bolívia de assumir o controle pleno da produção, venda e exportação de petróleo e gás já estava prevista em um contrato negociado em outubro e que isso não vai prejudicar o fornecimento de gás para o Brasil.
A preocupação da estatal brasileira é outra: quanto ela vai receber de indenização pelas duas refinarias que o governo da Bolívia nacionalizou há um ano? Os bolivianos oferecem entre US$ 50 milhões e US$ 70 milhões pelas refinarias. A Petrobras quer US$ 200 milhões.
O governo brasileiro tem se esforçado para evitar decisões unilaterais da Bolívia, como o confisco do fluxo de caixa das refinarias. O presidente Lula e a Petrobras não aceitam isso. Nos últimos dias, o governo brasileiro tem pressionado o país vizinho e pedido cautela. Falta saber se o presidente Evo Morales vai atender ao Brasil.
A favor do Brasil, está o fato de que a Bolívia precisa de investimentos estrangeiros no setor. O ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, que está nos Estados Unidos, disse por telefone que as negociações vão bem.
"Eu não acredito em qualquer atitude que venha agredir o clima, que é muito bom, de negociação, e que está avançando, que está avançando positivamente. É a questão fundamental, que é o preço das refinarias, e que o ministro de Minas [e Energia da Bolívia] tem demonstrado toda a disposição para negociar a forma como será feita a transferência de controle acionário", afirmou o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau.
Luiz Pinguelli Rosa, especialista em energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), acha que o mais importante é garantir o fornecimento de gás, o que está sendo feito.
"O problema das refinarias é um problema da Petrobras empresa, de quem é acionista dela, incluindo o próprio governo, mas não é o interesse nacional que está em jogo. É pouco dinheiro. Foi um investimento, inclusive, equivocado da Petrobras em comprar refinarias na Bolívia. Correu o risco", avalia o especialista da UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa.
O diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura, Adriano Pires, diz que a Bolívia não é mais um bom negócio para a Petrobras, mas, por enquanto, a empresa não pode simplesmente sair de lá.
"Agora a Petrobras não pode abandonar a Bolívia, principalmente porque o Brasil depende muito do gás boliviano. Hoje, 50% do gás que a gente consome vêm da Bolívia. A gente pode, a qualquer momento, ter uma crise de energia elétrica. Se tiver uma crise de energia elétrica, vai precisar de gás para que as usinas térmicas possam usar energia elétrica com esse gás. Então, a gente pode ter um racionamento de gás em função de uma crise de energia elétrica. Hoje a gente está refém da Bolívia. Na minha opinião, nós estamos reféns da Bolívia nos próximos quatro anos", calcula Adriano Pires.
Ao que tudo indica, a conversa mais dura entre Evo Morales e o presidente Lula, dias atrás, parece ter dado resultado.