Embora tenha se recuperado nas últimas semanas e viva o melhor momento desde o fim do ano passado, a Bovespa ainda é um investimento arriscado neste momento, opinam analistas do mercado. As boas notícias recentes podem ser insuficientes para segurar o ritmo de negócios, diante do cenário de economia em recessão e rodeada por incertezas.
Termômetro dos negócios da Bolsa, o Ibovespa superou, na primeira semana do mês, a marca de 54 mil pontos pela primeira vez no ano, alcançando o maior patamar desde novembro de 2014. A alta no volume de negócios se deveu, sobretudo, ao arrefecimento da crise do governo, com a escolha de Michel Temer (PMDB) para a interlocução política; e ao trabalho de resgate da confiança do investidor conduzido por Joaquim Levy, focado em equilibrar as contas públicas e resgatar o superávit primário.
Um dos problemas é justamente a incerteza quanto à capacidade de Levy seguir atuando nessa direção saneadora. “O mercado não conseguiu entender quanta autonomia o Levy tem e vai ter. Ele deu demonstrações de vontade de mudança, mas foi podado pela presidente e já colocou o cargo à disposição duas vezes”, lembra o sócio da corretora Elite, Rilton Brum.
O trabalho do ministro é considerado fundamental para inspirar em consumidores e no empresariado a convicção de que a economia vai se recuperar. Isso poria fim ao ciclo de retração de consumo e investimentos que afeta os resultados das empresas e, em consequência, os resultados da Bolsa. “Um ciclo de aperto de juros vai se traduzir em mais custos para as empresas e menos atratividade da bolsa”, projeta Bruno Gonçalves, analista fundamentalista da corretora WinTrade.
Este é um momento muito perigoso para entrar na Bolsa, especialmente se for para comprar ações da Petrobras. Sem o balanço, não dá para saber quanto ela vale.
Também há dúvidas sobre os números do balanço da Petrobras referente ao ano passado, que deve ser divulgado nesta quarta-feira (22). Embora as ações da companha tenham subido com força no último mês – o que fez a alta acumulada desde janeiro chegar perto de 40% –, os efeitos da Operação Lava Jato sobre a companhia são imprevisíveis. “Este é um momento muito perigoso para entrar na Bolsa, especialmente se for para comprar ações da Petrobras. Sem o balanço, não dá para saber quanto a companhia vale”, alerta Raymundo Magliano Neto, presidente da corretora Magliano.
Rating e juros nos EUA
O horizonte dos investidores contempla dois fatores de prazo mais longo: o iminente reajuste dos juros americanos pelo Federal Reserve (Fed), o banco central local; e a possibilidade de o Brasil perder a nota que lhe confere grau de investimento pelas agências de classificação de risco.
O aumento dos juros dos EUA é esperado para este ano, mas sem data definida. Gonçalves diz que a medida deve ter como impacto principal na Bolsa a migração de investimentos para o mercado americano de renda fixa, que se tornará mais atraente. Também é esperada mais valorização do dólar.
O temor do rebaixamento da nota de crédito brasileira poderia ter sido diluído no último dia 9, com a manutenção de rating dada pela Fitch. A agência, porém, mudou a perspectiva da classificação, de neutra para negativa, o que preservou a preocupação de que isso ocorra e afete os investimentos feitos no país.
Com maior alta do ano, Petrobras ainda desperta desconfiança
A ação que mais se valorizou na Bovespa desde janeiro – considerando os 20 ativos mais negociados no período de 12 meses até março – foi a da Petrobras, com alta de quase 40%. Apesar disso, ainda há receio, no mercado, de apostar na empresa.
“A Petrobras é uma caixinha de surpresas. Há muitos fatores desconhecidos ao redor da empresa, como o tamanho do buraco da corrupção e o atraso na divulgação do balanço”, afirma Bruno Gonçalves, analista fundamentalista da WinTrade.
Completam a lista das cinco ações mais valorizadas no ano Ultrapar, BM&FBovespa, Ambev e BB Seguridade, com valorizações de 16% a 29%. Por outro lado, lideram as quedas as ações de Kroton, Oi, Vale e Estácio, com desvalorizações que oscilam de 13% a 28%.
As empresas que se beneficiam do dólar valorizado, como as exportadoras, são as mais indicadas para investimentos neste momento, apontam os analistas. Outro caminho é o de empresas cuja atividade é menos vulnerável ao momento ruim da economia, especialmente as de consumo básico.
Gonçalves destaca os setores de alimentos e bebidas, que dependem menos de crédito, cuja concessão está mais restritiva. Raymundo Magliano Neto, da corretora Magliano, vê potencial também nos setores de medicamentos e de meios de pagamentos, que costumam manter bons níveis de negócios. Entre as empresas que ele indica estão Ambev, Raia Drogasil e Cielo.
Apesar das sugestões, não há garantia de retorno e a estimativa é de um 2015 difícil. “Não é nada fácil selecionar ações num cenário de juros altos e recessão, com PIB em queda. Acho difícil a Bolsa subir mais do que já subiu”, diz Magliano Neto. (RC)
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