A operação da Polícia Federal pôs em xeque a estratégia de comunicação dos principais fabricantes de carne do país. Se nos últimos anos os frigoríficos fortaleceram as marcas de seus produtos e contrataram uma legião de famosos para falar com os consumidores, agora as denúncias de que vendiam itens estragados vão afetar em cheio a sua credibilidade, dizem publicitários. Isso porque, segundo eles, o pilar principal das campanhas era justamente a qualidade.
Embora as principais empresas envolvidas na Operação Carne Fraca tenha marcas bem conhecidas do consumidor, ainda não se sabe a extensão do problema. Alguns dos frigoríficos envolvidos forneciam carnes para outras marcas e não se sabe ao certo até onde a carne adulterada chegou. Mas a PF não divulgou nem marcas, nem lotes específicos que teriam sofrido adulteração. Esses detalhes, inclusive, devem ser passados em breve para as autoridades sanitárias.
Ainda na noite de sexta-feira (17), o secretário-executivo do Ministério da Agricultura, Eumar Novacki, e os delegados responsáveis pela operação disseram a alguns jornais que a população brasileira “pode ficar tranquila”, já que os casos encontrados são pontuais e não colocam em risco a saúde da população.
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Para Fabio Astolpho, diretor de Criação da agência de publicidade F.biz, a credibilidade é afetada de “forma estrondosa”. O caminho para recuperar a imagem torna-se longo e muito difícil, diz ele.
“Uma denúncia desse porte afeta anos de trabalho de construção de marca. Afeta no ambiente on-line, onde as pessoas tendem a ser mais críticas. Esse é o tipo de problema que não se dribla. Muda-se o comportamento da empresa, e a comunicação vai refletir isso.”
Armando Strozenberg, presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), também acredita que a imagem da marca é afetada. “A extensão do dano vai depender do tamanho do suposto erro, que ainda não está dimensionado em relação a cada empresa ou marca. E a maneira de enfrentar o problema vai determinar se ele será agravado ou minimizado.”
Nos últimos anos, a JBS investiu na comunicação da marca Friboi. A estratégia da campanha foi incentivar o consumidor a pedir a carne pela marca, criando pela primeira vez esse conceito na categoria. Do outro lado, a BR Foods apostou no reposicionamento da Perdigão.
Marcelo Boschi, coordenador do MBA de Marketing da ESPM, compara o problema do setor de carne com a crise no segmento de leite, quando empresas adulteravam seus produtos com soda cáustica, água oxigenada e formol. O problema afetou diversas marcas como a Parmalat, uma das primeiras da categoria a fazer investimento em marca.
“O caso da Friboi é muito semelhante com o da Parmalat. Foram marcas que impulsionaram a construção de marca nas categorias. Porém, nesse caso específico, os frigoríficos investem em marcas corporativas, o que minimiza os impactos em suas marcas de consumo.”
José Luiz Meinberg, professor dos MBAs da Fundação Getulio Vargas, acredita que a ação da PF afeta as empresas de forma diferente. Ele diz que a marca Friboi sai mais arranhada por estar muito presente na cabeça do consumidor.
“O impacto vai depender de como essa crise vai afetar o dia a dia do consumidor.”
Bruno Dreux, sócio da agência Amo, diz que a categoria não conta com muitos concorrentes, o que ajuda a minimizar os impactos nas vendas. “O consumidor não tem muito para onde migrar. Mas, sem dúvida, as marcas têm um problema para resolver.”
Quais são as marcas das empresas diretamente envolvidas na Operação Carne Fraca
BRF
Receita em 2016: R$ 33,7 bilhões
Prejuízo em 2016: R$ 372,3 milhões
Funcionários: 105 mil
JBS
Receita em 2016: R$ 170,3 bilhões
Lucro Líquido em 2016: R$ 376 milhões
Funcionários:125 mil
Além das duas gigantes, o Grupo Peccin e o Frigorífico Souza Ramos também citados diretamente nos despachos da ação.
O que dizem as empresas
Segundo um anúncio publicado na edição de fim de semana da Gazeta do Povo, a JBS listou uma série de medidas de controle de qualidade, entre elas as 340 auditorias que as unidades da empresa teriam recebido nos últimos dois anos. Segundo a empresa, “no despacho da Justiça Federal que deflagrou a operação, não há qualquer menção a irregularidades sanitárias ou à qualidade dos produtos da JBS e suas marcas”.
A JBS também diz que “os lamentáveis casos citados na imprensa sobre produtos adulterados não envolvem nenhuma das marcas da JBS. Nenhuma planta da JBS foi interditada pelas autoridades”. A empresa admite que um funcionário de uma unidade da Lapa, no Paraná, foi citado, mas que “não compactua com qualquer desvio de conduta” e “tomará medidas cabíveis”. Por fim, a JBS se coloca disposição das autoridades, clientes e consumidores para esclarecimentos.
À Agência O Globo, a BRF disse, por nota, que “está colaborando com as autoridades para o esclarecimento dos fatos”. A companhia reiterou “que cumpre as normas e regulamentos referentes à produção e comercialização de seus produtos, possui rigorosos processos e controles e não compactua com práticas ilícitas”. Já em anúncio publicado na versão impressa da Gazeta do Povo, a BRF também disse que “respeita seus consumidores e as leis do nosso país e por isso cumpre todas as normas e regulamentos referentes à produção e à comercialização dos seus produtos”.