Mesmo buscando ser conservador na elaboração de seu primeiro Orçamento, o governo Michel Temer foi otimista em seu cenário de receitas e despesas para 2017. Especialistas e técnicos da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados afirmam que incluir no projeto de Lei Orçamentária Anual R$ 18,4 bilhões decorrentes de novas concessões e permissões e R$ 11,8 bilhões de vendas de ativos foi um risco.
Isso porque não há garantias de que esses recursos entrarão nos cofres públicos. Na lista dos ativos estão: Caixa Seguradora, Loteria Instantânea, BR Distribuidora e IRB.
“A tendência é que a receita ainda esteja superestimada. Tem uma parte grande com concessões e vendas de ativos que sempre entra na conta e acaba não se concretizando. Se fosse para o Orçamento ser mais realista, a receita deveria vir mais ponderada”, diz um técnico da consultoria.
Otimismo
Ele aponta que também houve otimismo do lado das despesas. Para atingir a meta fiscal de 2017, fixada em déficit primário de R$ 139 bilhões, ou 2% do Produto Interno Bruto (PIB), o governo espera reduzir gastos em R$ 5,3 bilhões com ações administrativas, revisões de subsídios e de programas como auxílio-doença, seguro-desemprego, abono salarial e a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas). Essa é uma prática antiga que sempre foi criticada por especialistas em contas públicas por não garantir resultados efetivos.
O técnico da consultoria destaca ainda que os gastos com abono e seguro-desemprego, por exemplo, estão estimados em R$ 57,4 bilhões para 2017, o que representa queda de R$ 2,5 bilhões em relação a 2016. Isso ocorre num momento em que o desemprego está elevado no país.
A previsão de despesas com a Lei Kandir (que compensa estados por incentivos a empresas exportadoras) foi colocada em R$ 1,95 bilhão, metade do que costuma ser destinado aos governadores. Ou seja, pressões políticas podem acabar elevando essa despesa.
Para o especialista em contas públicas Felipe Salto, o crescimento real de quase 4,5% nas receitas previsto pelo governo na lei orçamentária é improvável, uma vez que isso exigiria que a arrecadação crescesse em um patamar muito superior à previsão de crescimento da economia, projetado em 1,6%. Pelas contas do governo, a receita líquida de 2017 será de R$ 1,177 trilhão, ou 17,26% do PIB.
“A receita está muito inflada. Mesmo que o PIB cresça a 2%, a receita crescer o dobro é muita elasticidade. Há um certo irrealismo nesse dado, o que significa que o déficit pode ser maior no ano que vem”, ressalta Salto.
”Receitas factíveis”
O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia, no entanto, rebate as críticas. Ele afirma que o governo foi cauteloso na composição do projeto, usando parâmetros realistas. E assegura ainda que a equipe econômica está comprometida com a meta fiscal e, se for necessário, fará um contingenciamento de despesas para garantir o número.
“Discordo da visão de que há otimismo ou falta de realismo no Orçamento. Usamos os parâmetros macroeconômicos adequados. E, mesmo que tenha, por hipótese, uma frustração de receitas, vamos ter que fazer contingenciamento de despesas. Vamos tomar todas as medidas necessárias”, disse Guardia.
“Nossas receitas com concessões são absolutamente factíveis. Dos R$ 24 bilhões previstos dessas receitas em 2017, existe um valor que já está entrando nos cofres. E a venda de ativos são projetos que já estão em curso, que o governo tem determinação de fazer”, acrescentou.
O secretário-executivo afirmou, ainda, que o cenário para as despesas também é factível e que o projeto é compatível com a proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos. Também neste caso, se o governo não conseguir cortar o que espera em alguma área, vai ajustar em outra para respeitar o teto: “Também se ajusta nas demais despesas. Há um compromisso com a meta, ela será entregue.”
No cenário fiscal traçado, a dívida bruta do governo (principal indicador de solvência observado pelo mercado internacional) subirá de 72,5% do PIB em 2016 para 75,8% do PIB em 2017. Esse indicador continuará subindo até 2019, quando atingirá 77,7%. Já a dívida líquida do setor público terá uma elevação de 45,9% do PIB este ano para 49,4% no próximo, chegando a 52,5% do PIB em 2019.