O governo Temer tem dito que quer baixar o custo do crédito. Mas nenhuma das medidas que anunciou toca num aspecto que, para muitos especialistas, está entre as principais causas das elevadas taxas de juros do país: o poder de mercado dos grandes bancos.
O predomínio cresceu com a compra do HSBC pelo Bradesco, aprovada pelo Banco Central há um ano, e a venda da operação brasileira do Citi para o Itaú, dois meses atrás.
Tema historicamente evitado pelo Planalto, a concentração de ativos, depósitos e operações de crédito nas mãos de poucas instituições dificulta a vida de empresas e pessoas, que têm menos opções para pegar um empréstimo e quase nenhum poder de barganha para renegociar uma dívida.
No fim de junho, os quatro maiores bancos – Banco do Brasil, Itaú, Caixa e Bradesco – detinham 70% dos ativos e 75% dos depósitos do sistema financeiro, segundo o mais recente Relatório de Estabilidade Financeira do Banco Central. Nos empréstimos, a fatia dos quatro maiores chegou a 77%, a mais alta da série histórica disponível nos relatórios do BC. Dez anos antes, o porcentual era de aproximadamente 54%.
Embora dezenas de bancos disputem os 23% restantes do mercado de crédito, o cliente comum que estiver insatisfeito com os quatro maiores quase não tem para onde correr. A começar porque a portabilidade de crédito e cadastro, instituída há uma década, não teve o efeito esperado sobre os juros e as tarifas bancárias.
Há outros obstáculos. À exceção do Santander, o quinto maior banco do país, e das financeiras que oferecem crédito pessoal a taxas geralmente mais altas, a maioria dos demais bancos atua em nichos, voltados a clientes ricos ou empresas. Não é qualquer um que consegue financiamento no BTG Pactual, no Safra ou no Credit Suisse, para citar alguns.
Restam as cooperativas de crédito, que emprestam dinheiro a cooperados, e os bancos digitais. Embora eles estejam conquistando muitos adeptos na área de cartões de crédito, sua atuação nas outras modalidades de empréstimo é tímida.
Menos opções
Há duas décadas, as empresas brasileiras tinham contas em mais bancos. Com um limite de cheque especial em cada um, era mais fácil lidar com os momentos de crise. Hoje, a margem de manobra é bem menor.
“Na década de 1990, tínhamos 16 grandes bancos privados nacionais de varejo. Sobraram dois. As empresas tinham dez contas bancárias, em média. Hoje são quatro ou cinco”, diz Alberto Borges Matias, professor de finanças da USP de Ribeirão Preto. “Essa concentração é maléfica porque reduz a oferta de crédito, que é como sangue para a economia.”
Um dos indicadores usados pelo Banco Central para monitorar a concentração bancária é o Índice de Herfindahl-Hirschmann (IHH). Que, no mercado de crédito, atingiu em junho a marca de 1.667 pontos, a maior da série histórica. O nível ainda está dentro do intervalo que o BC considera de “moderada concentração” (1.000 a 1.800 pontos), mas nunca esteve tão perto do patamar de “elevada concentração” (acima de 1.800).
“Quando fui diretor de banco, não via muita concorrência no setor. E esse quadro só piorou”, diz Fernando Meibak, sócio da Moneyplan Consultoria, que foi executivo do ABN Amro Real e do HSBC. “A ameaça de entrar uma instituição nova capaz de competir com os grandes praticamente inexiste.”