| Foto: Felipe Mayerle/Ilustração Gazeta do Povo

É correto relacionar o uso de preto nos recentes protestos contra a corrupção com a imagem dos chamados ‘balilas’, o grupo paramilitar fascista criado por Bento Mussolini para doutrinar jovens italianos? É exato dizer que vestir-se dessa cor nesse caso significa desprezar a democracia e exalar ódio? O assunto é polêmico e foi assim que uma professora do Colégio Medianeira, de Curitiba, se manifestou em sua conta pessoal do Facebook para descrever alunos daquela escola na última terça-feira (22).

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A imagem postada pela professora do Colégio Medianeira: a organização paramilitar fascista de Mussolini para jovens 

O texto completo do post era o seguinte: “Hoje vi crianças numa escola, vestindo preto e pedindo golpe. Desprezando a democracia e exalando ódio. Parece que não conseguimos escapar do que Marx profetizou quando disse que a História de repete, primeiro como tragédia, depois como farsa…” A foto pode ser vista ao lado.

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O comentário – que posteriormente foi retirado pela autora – ‘vazou’ e circulou pelas redes sociais dos pais gerando polêmica. O colégio, em um primeiro momento, publicou uma carta na Internet, sem referir-se ao caso, dizendo que era fundamental que todos no colégio “possam manifestar seus pensamentos” e saibam conviver “em meio à diversidade de opiniões e de posicionamentos políticos”. Nesta quarta, em carta aos pais, informou que “após as manifestações dos alunos nas últimas semanas” decidiu pela “suspensão temporária de novos movimentos dentro do Colégio”.

As opiniões acaloradas nos dois lados penderam entre liberdade de expressão e a responsabilidade dos professores de não impor apenas uma versão dos fatos, principalmente nas aulas de história. Para especialistas, o professor não pode esquecer que é referência para os alunos, dentro e fora da sala de aula e, por isso, tem uma responsabilidade maior no atuar. Ainda mais nas redes sociais.

“Não existe verdade única ou absoluta; toda discussão requer maturidade, tolerância, cuidado para não perder de vista a defesa dos diretos fundamentais”, alerta Maria Cecília Pilla, coordenadora do programa do Mestrado de Direitos Humanos e Politicas Públicas da PUCPR. “Uma postura crítica sobre o próprio posicionamento na internet dá trabalho, mas é fundamental”, acrescenta a psicopedagoga Evelise Portilho, doutora em educação e professora da PUCPR. “Todo cuidado é muito importante e necessário. A atitude tem de ser coerente com o que se ensina, ou o discurso é vazio”.

Principalmente nas séries iniciais, o professor tem a responsabilidade de manter uma postura neutra, segundo a psicóloga clínica e filósofa Alba Regina Bonotto. “Isso significa mostrar os dois lados e tentar evitar ter postura apaixonada. Nossa sociedade é imatura, muitas das reações das pessoas são infantilizadas, movidas por paixões e imediatismo. É muito difícil para o professor ficar imune a isso e, nesse cenário, precisa se proteger”, diz.

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Os docentes não podem esquecer também, avalia Maria Cecília Pilla, da PUCPR, que representam a instituição em que trabalham. Ela mesma já abandonou o Facebook em uma atitude que chamou de autopreservação. “Muitas vezes cheguei a escrever um post e apagar, pois a liberdade de expressão pressupõe que posso ter uma resposta que não seja a que combina com o que eu penso. Não adianta dizer ‘a página do Facebook’ é minha, pois ela é sua, mas é da rede social também e é pública”, afirma.

Eduardo Oyakawa, professor de Filosofia especialista em Psicologia Social, é ainda mais radical: orienta os docentes a não se exporem nas redes sociais. “Há muitos casos em que os professores acabam sendo acuados e intimidados por suas opiniões”, lamenta.

Debate na escola

No caso do Colégio Medianeira, dada a proporção que a história tomou, trazer o debate para dentro da escola seria a melhor forma de ensinar aos estudantes como lidar com conflitos, segundo a professora do Departamentos de Educação da UFPR Lidia Weber, coordenadora do Núcleo de Análise do Comportamento (NAC). “Não se pode esconder nada de crianças e adolescentes em casos assim e esse é um excelente momento para discutir o assunto. Um professor tem o direito de colocar a opinião na rede pública sabendo que os alunos vão ler, mas tem de arcar com as consequências”, afirma.

Maria Cecília Pilla lembra que muitas pessoas morreram ao longo da história para chegarmos ao nível atual de preocupação com os direitos humanos, e isso não deve ser colocado em risco. “Ao longo da história tantas vidas já foram ceifadas em vão. Por isso, para assegurarmos nossas conquistas no sentido da liberdade e da fraternidade é preciso respeitar a opinião do outro.”