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O sujeito era tão fanático ­­por futebol, que não ad­mi­­tia em hipótese alguma a concorrência do esporte com outros eventos. E ainda culpava o outro como sendo atravessador nesta via, para ele, de mão única.

No caso do carnaval, o grande vilão teria sido um suposto historiador que criou o maldito calendário gregoriano, sem antes consultar astrônomos famosos, como o doutor Ricardo Teixeira, que poderiam evitar a colisão de interesses populares.

Revoltado, nosso personagem meteu a boca no trombone e cuspiu fogo contra tudo e contra todos, não poupando foliões, escolas de samba, turistas e todos aqueles que tivessem ligação com esta orgia coletiva que co­­meça hoje.

"Onde é que já se viu enfiar essa festa pagã, que atrai um bando de malucos, justo no meio de campeonatos regionais?", dizia. Não parava por aí e praguejava: "Nossos deuses tupiniquins, He­­leno e Nabi, vão acabar com esta pouca vergonha, com esta luxúria. Haverá mais enchentes em São Paulo; mais fogo nos barracões de escolas do Rio; mais frio em Curitiba. Ninguém nas ruas!", bradava.

Todo este barulho porque os deuses do futebol conflitavam com os interesses de Dionísio e Afrodite – pai e mãe do prazer – na disputa dos mesmos espaços e por eventos distintos.

Não adiantaram em nada pi­­quetes, panelaços, apitos e passeatas pela Cândido de Abreu. Até liminar para suspender o carnaval nosso amigo tentou, mas o juiz de plantão não concedeu.

Sua última cartada, espécie de prova dos nove, foi consultar um famoso vidente, esperando sair do inferno astral. Qual o que, Pai Severiano confirmou com todas as letras: "O carnaval não será cancelado no Brasil. Haverá sim trio elétrico em Salvador, frevo em Olinda e desfile na Marquês de Sapucaí".

Folia por toda parte e gente viajando para todos os cantos do país. Em Curitiba, pelas bandas do Cen­­tro Cívico, samba no pé e desfile de celebridades pelos campos de futebol. Tudo ao mesmo tempo e por culpa exclusiva daquele irresponsável historiador que inventou o tal calendário gregoriano para prejudicar o futebol.

Para o inconformado torcedor, que não admite essas coincidências de datas, resta somente roer a corda, se fantasiar de Clovis Bor­­nay e soltar a franga na avenida: "Que óóóódio!"

Que mal lhe pergunte:

Aryon Cornelsen, Manoel Higino dos Santos, Jofre Cabral e Silva, Hipólito Arzua, Evangelino da Costa Neves e Waldomiro Perini, entre outros, receberam alguma homenagem digna por tudo o que fizeram por seus clubes?

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