Para especialistas, o caminho para quem se sentir ofendido com qualquer publicação é o judicial, jamais a censura ou a violência| Foto: STF/EFE
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Adão Iturrusgarai: É um absurdo que se pense esse tipo de coisa, culpar a revista. Humor não tem que ter limites. Quem pensa isso não conhece o humor francês. Estou perdendo o sono com as bobagens que as pessoas têm dito. Quem não concorda com algo deve recorrer à justiça. O ato de pegar em armas e matar não tem a ver com religião, é loucura mesmo. O pior foi essa perda, o humor fica mais pobre, mas, por outro lado, vai se fortalecer.
Benett: Quando você limita o humor já começa matando parte da piada. Mas também acho que tem os lugares certos para veicular cada tipo de humor. O Charlie Hebdo não era lugar para as tiras do Garfield, por exemplo. A liberdade de expressão tem que ser absoluta. Cada um escolhe a melhor forma de se expressar. Eles faziam isso com cartuns. Outros fazem com um fuzil apontado para a sua cabeça. Independentemente de os cartuns serem bons ou ruins, agressivos ou não, eles foram assassinados e não há nenhum argumento que justifique isso
Allan Sieber: É humor. São piadas, é para as pessoas rirem, não é uma coisa séria. O limite quem dá é você. Um grande mal para um cartunista é se autocensurar. Culpar a revista eu acho vergonhoso. É um retrato do estágio em que a humanidade está hoje. Como assim? Isso justifica matar alguém? Por um cartum? Acho patético. O triste é que os caras sempre foram de esquerda e o paradoxo é que a morte deles vai servir para a direita endurecer com os muçulmanos
Paulo Caruso: Tem que ter parâmetros para não provocar a fúria religiosa como ocorreu. De alguma maneira, provocaram essa tragédia. Agora, serem massacrados como se fossem guerrilheiros, isso é absolutamente desumano. É uma tragédia. Você se posicionar contra a autocensura é um engodo. Você sempre produz a partir de suas experiências, sempre há critérios internos. Por que esse ataque aos símbolos de uma religião? É um jogo meio infantil de transcender os limites
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O ataque terrorista à revista humorística francesa Charlie Hebdo, que vitimou 12 pessoas, reacendeu no mundo todo o debate sobre a liberdade de expressão. No Brasil, justamente no momento em que o governo federal analisa a possibilidade de regulação da mídia, não foi diferente. Da defesa incondicional ao direito de se expressar à tese do respeito às religiões e seus símbolos, o tema ganhou espaço em jornais, rádio, tevê e redes sociais.

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A proteção do direito ao culto religioso é uma preocupação da maioria das democracias ocidentais. À exceção dos Estados Unidos, onde a liberdade de manifestação é quase absoluta, outros países estabeleceram em suas legislações, ainda que leves, uma série de restrições e punições contra ofensas a grupos religiosos. O artigo 208 do Código Penal no Brasil estabelece pena de multa ou detenção de até um ano para quem, por exemplo, "escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa". Ou seja: é o conteúdo da publicação que será levado em conta pela Justiça brasileira em caso de contestações. "O intuito é garantir o respeito, a tolerância e as liberdades individuais", explica Sandro Mansur Gibran, integrante da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB-PR.

Outros países, como Portugal e Alemanha, também criminalizam ofensas de cunho religioso, mas desde que tenham potencial para causar perturbações à paz pública. Nesse caso, são as consequências que são analisadas. "Tem de haver punição para que abusos não ocorram", avalia Gibran.

"Todas as liberdades e direitos são relativos", diz o professor do curso de Direito da UFPR Egon Bockmann Moreira. Para o especialista, uma pessoa pública, por exemplo, aos olhos da Justiça, tem menos direito à privacidade do que um cidadão comum. "Não se trata de uma análise subjetiva, mas de racionalidade, de ponderação." Para ele, é fundamental analisar o grau da ofensa para estabelecer a respectiva responsabilização. "O direito penal não é o primeiro a ser aplicado. Deve ser interpretado restritivamente", diz.

Já o professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Adolpho Queiroz defende liberdade irrestrita, especialmente para a abordagem humorística. "A característica do humor gráfico, desde seu início, é de contestação. Você não vai encontrar humor chapa branca. O que dá certo historicamente é o que contesta, politicamente e religiosamente também." Presidente do Salão Internacional de Humor de Piracicaba, o mais importante do país, Queiroz ressalta que mesmo os muçulmanos são adeptos do humor. "O Irã é o segundo país que mais envia trabalhos, atrás apenas do Brasil. A cultura do humor, respeitadas as premissas religiosas, não é novidade para eles", afirma.

Via judicial

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Todos concordam, porém, que o caminho para quem se sinta ofendido com qualquer publicação é o judicial. "Ainda que haja um crime contra o sentimento religioso, [ele] nunca [deve ser resolvido] por mãos próprias ou de forma violenta", conclui Gibran.

"Se houver abuso, [o responsável] deve se sujeitar às penas previstas na legislação. Mas jamais anteriormente. Isso é censura", avalia Moreira.

E seja qual for o grau da ofensa, uma coisa é certa: nada pode se sobrepor ao direito à vida.

O que pensam os humoristas