O despertar do mundo árabe deve trazer uma nova luz a Washington
Mesmo que os protestos que abalam o Egito cessem nos próximos dias, o caos instaurado no país mudou para sempre a relação entre o povo egípcio e seu governo.
Cairo - O ditador do Egito, Hosni Mubarak, 82 anos, lançou uma violenta ofensiva contra o movimento que exige sua saída do cargo, coordenando um ataque de seus simpatizantes contra milhares de manifestantes oposicionistas acampados no centro da capital, Cairo.
A Praça Tahrir, epicentro da revolta antigoverno iniciada há nove dias em todo o país, transformou-se em cenário de uma guerra civil que matou ao menos 3 pessoas e feriu 639.
A ação do governo para pôr fim ao levante começou a ser delineada em discurso feito ontem pelo ditador, no qual Mubarak, no poder desde 1981, anunciou que não concorreria a um oitavo mandato seguido nas eleições presidenciais de setembro pleitos no Egito são amplamente vistos como manipulados pelo governo.
O movimento anti-Mubarak rejeitou o anúncio e prometeu seguir protestando por sua saída imediata. O Exército, visto com simpatia pela oposição, reagiu pedindo aos manifestantes que abandonassem a praça, num possível sinal antecipado dos transtornos em porvir.
Em meio a um bombardeio de propaganda pró-Mubarak na tevê oficial, dezenas de pessoas se aglomeraram na manhã de ontem em frente ao complexo de prédios que abriga parte da imprensa nacional e estrangeira. Pessoas carregando retratos do ditador gritavam "não vá embora e "com minha alma e meu sangue, me sacrificarei por ti, ó Mubarak.
Horas depois, o número de simpatizantes do regime chegava a milhares. Surgiram então os primeiros gritos de "vamos todos tomar Tahrir. Uma gigantesca coluna começou a marchar rumo à praça, a menos de um quilômetro.
Após as primeiras trocas de socos e pontapés, manifestantes começaram a quebrar a calçada com o intuito de formar pedras para ser jogadas contra os inimigos. A reportagem viu também pessoas desmontando cartazes para usar a estrutura de metal e madeira como paus. Um caminhão militar teve o parabrisa quebrado por pessoas que queriam usar estilhaços como armas.
As multidões pró e antigoverno avançavam alternadamente, umas contra as outras, numa incontrolável movimentação de massas.
Numa cena surreal, as fileiras pró-Mubarak se abriram para deixar passar homens com paus e lanças e montados em cima de cavalos e dromedários, que avançaram a toda velocidade para cima dos anti-Mubarak. Soldados a bordo de tanques estacionados há dias na praça não se mexiam. Não havia nenhum policial visível nas ruas.
A violência aumentou ao anoitecer. Uma barricada feita com pedaços de lataria de carros separava até agora os dois campos a cerca de 100 metros do centro da praça. Choviam pedras e coquetéis molotov dos dois lados.
Alguns militantes corriam entre a multidão levando caixas de legumes cheias de tijolos e pedaços de calçadas até a linha de frente, que arremessava os projéteis ininterruptamente. Árvores em volta da avenida estavam em chamas. Disparos de armas eram ouvidos com frequência.
A todo instante, a multidão se abria para deixar passar grupos de homens carregando os feridos da linha de frente, quase todos jovens atingidos na cabeça por pedras. Alguns gemiam de dor. Os feridos eram levados até ambulâncias estacionadas na retaguarda. Alguns iam a hospitais, outros voltavam ao campo de batalha após receber curativos. No chão, marcas de vômito.
Os manifestantes pró-governo eram quase todos homens aparentando idade entre 20 e 40 anos, o que reforça suspeitas de que muitos eram funcionários do Estado, especialmente do tentacular aparato de segurança. Há relatos de que agentes à paisana ofereciam dinheiro a quem se dispusesse a integrar os protestos.
Analistas também afirmam que os manifestantes pró-governo eram os mesmos que haviam cometido os saques do último fim de semana, incluindo prisioneiros que foram libertados em meio ao caos.
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