A França se prepara para virar uma página na História da República, independentemente de quem seja o eleito no domingo para ocupar a liderança do Estado: o conservador Nicolas Sarkozy ou a socialista Ségolène Royal .
As sondagens apontam para Sarkozy como o grande favorito a suceder a Jacques Chirac, de 74 anos, no Palácio do Eliseu. Com a vantagem do conservador, Ségolène subiu o tom das críticas no último dia de campanha, quando o instituto Ipsos divulgou pesquisa em que ele aparece liderando com o dobro da vantagem que tinha semana anterior: 55% contra 45% das intenções de voto. Mas a única certeza até que se conheça o veredicto das urnas é que estas eleições encerram um longo capítulo de 12 anos escrito pelo veterano político, que abre espaço para os mais novos.
Sarkozy tem 52 anos e Ségolène, a primeira mulher com possibilidade de chegar ao Eliseu, 53, o que significa a ascensão de uma nova geração política ao poder, com a pretensão de renovar as práticas, os usos e os costumes. Reflexo destes novos ares é a disposição da França a decidir entre um divorciado, casado pela segunda vez e pai de três filhos de seus dois casamentos, e uma solteira, mãe de quatro filhos com o seu companheiro e líder socialista, François Hollande.
Surpresas na reta final da campanha
O conservador deseja fazer reformas na França, especialmente na área econômica, com corte de gastos e mudanças na burocracia estatal. Ele também destaca a necessidade de "liquidar" o espírito revolucionário de maio de 68, para acabar com os "bloqueios" e a "impotência política", relançando "a moral, a autoridade, o trabalho e a nação".
As promessas agradam a muitos setores, especialmente ao empresariado francês, mas, segundo reportagem do jornal "New York Times", as pesquisas mostraram que quase metade dos eleitores franceses tem medo de Sarkozy - medo de sua volatilidade, de seu temperamento, de sua incapacidade para manter o país unido e seu comportamento inflexível.
Ségolène pode ter apostado nisso quando partiu para o ataque e disse na sexta-feira que a candidatura de Sarkozy representava um perigo para França. Numa referência ao episódio em que o conservador - então ministro do Interior - chamou de gentalha os imigrantes envolvidos em distúrbios nos subúrbios parisienses em 2005, a socialista afirmou que caso seu rival fosse eleito o país enfrentaria a deflagração da violência e da brutalidade.
Sarkozy respondeu de forma irônica, mas sem a aspereza de costume, dizendo que a candidata não estava de bom humor, "talvez por causa das pesquisas de opinião". Ele condenou, no sábado, o que chamou de "linguagem de guerra" da concorrente.
Ségolène já havia supreendido na reta final da campanha, quando mostrou-se mais firme do que de costume no debate televisionado de quarta-feira . A socialista aposta em mudanças institucionais profundas que permitam passar para uma sexta república com maior peso social.
Numa eleição em que a autoridade parece mais valorizada do que a compaixão, a plataforma da socialista garantiu que ela conquistasse a simpatia, mas não a confiança do eleitorado. Pesquisa do instituto BVA mostrou que para 57% entrevistados Sarkozy é o candidato mais competente, enquanto Ségolène ficou apenas 35%. Mas na pergunta sobre quem é mais simpático, Ségolène saiu na frente com 62%, deixando Sarkozy com apenas 29%.
As diferenças entre ambos giram em torno de seus respectivos modelos de sociedade e a forma como exerceram o poder. Sarkozy quer "resgatar o trabalho, o esforço, o mérito e o gosto pelo risco", enquanto Ségolène, em seu "pacto presidencial", investe na educação, na formação e na inovação.
Eleito vai enfrentar renovação legislativa em junho
O segundo turno começou no sábado nos territórios ultramarinos e nas representações francesas no continente americano , mas as primeiras pesquisas só devem ser divulgadas após o encerramento da votação na França, às 18h de domingo (15h de Brasília). Sendo Sarkozy ou Ségoléne, o sexto presidente da França terá que nomear um primeiro-ministro, preparar as eleições legislativas de 10 e 17 de junho e pôr em prática suas primeiras medidas.
O eleito terá no máximo dez dias para entrar no Eliseu, já que, oficialmente, o cargo de Chirac expira à meia-noite do próximo dia 17. Sarkozy disse que se for ele o agraciado vai tirar alguns dias de descanso e não pretende fazer a transmissão de poderes antes do dia 16. Ségolène, por sua vez, não fez qualquer previsão.
A primeira tarefa, em ambos os casos, será nomear um primeiro-ministro que sucederá a Dominique de Villepin: os mais cotados no caso de Sarkozy são, nesta ordem, seu conselheiro político François Fillon e os ministro de Coesão Social, Jean-Louis Borloo, e da Defesa, Michele Alliot-Marie.
No campo de Ségolène, o ex-ministro da Economia Dominique Strauss-Kahn aparece com força, seguido pelo deputado Jean-Marc Ayrault e o presidente regional Michel Sapin, além do centrista François Bayrou, candidato derrotado no primeiro turno que chegou a ser citado, mas cuja escolha parece improvável.
Nos dois casos, o novo chefe do Executivo, que será acompanhado por uma equipe de 14 ministros, terá como primeira missão conduzir a campanha das eleições legislativas, com o objetivo de conquistar a maioria na Assembléia Nacional, necessária para governar.
Ainda que pareça improvável, os analistas não descartam que os franceses elejam para a Assembléia uma maioria de ideologia diferente à do chefe de Estado, o que transformaria governo e levaria a uma convivência que obrigaria o novo presidente a refugiar-se em seus domínios reservados da política exterior e da defesa.
Candidatos têm planos para os primeiros dias
Diante do cenário mais factível, em que os franceses devem confirmar no Parlamento uma cômoda maioria para o novo presidente, Sarkozy disse que no seu primeiro dia de governo proporá quatro conferências para setembro: sobre a igualdade salarial, um contrato de trabalho único, melhorias nas condições de trabalho e democracia social. Seu segundo dia no cargo seria dedicado ao meio ambiente, e no terceiro faria duas viagens a Bruxelas e Berlim.
Assim como Ségolène, Sarkozy convocará uma sessão extraordinária do Parlamento no verão para aprovar uma lei que estabeleça serviços mínimos nos transportes em caso de greve e outra que endureça as penas contra delinqüentes reincidentes.
Já Ségolène, anunciou que sua primeira lei será para combater a violência contra as mulheres e que convocará uma conferência em junho sobre a revolarização do salário mínimo, que supera os 1.200 euros mensais.
Sobre a representação da França no exterior, as primeiras responsabilidades que o novo chefe de Estado terá que enfrentar serão a cúpula do G8 (grupo dos sete países mais industrializados e a Rússia) em Heiligendamm, na Alemanha, de 6 a 8 de junho, e o Conselho Europeu de Bruxelas, de 21 1 23 de junho.