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Pesquisadores franceses e suíços descreveram os segredos de uma cooperação muito curiosa: um vírus e uma vespa parasitoide que há milhões de anos convivem juntos para garantir sua mútua conservação. O estudo foi publicado há duas semanas na revista "Science".

A vespa costuma parasitar lagartas de borboleta, depositando seus ovos dentro delas. Quando eclodem, pequenas larvas começam a se alimentar dos tecidos internos do hospedeiro Se o sistema imunológico da lagarta identifica a presença dos ovos, tenta envolvê-los em uma cápsula para impedir seu desenvolvimento.

Aqui começa a associação entre a vespa e o vírus. Com os ovos, o inseto também injeta na lagarta um líquido rico em partículas virais - envelopes carregados de vírus, conhecidos como polidnavírus. As partículas se rompem e os polidnavírus infectam as células do sistema imunológico da lagarta, que não reconhece mais o parasita como um intruso.

Os polidnavírus foram identificados em 1967, mas sempre constituíram um mistério para a ciência. Ao contrário dos vírus convencionais, eles não carregam o material genético necessário para sua replicação dentro das células da lagarta. Sua única ação é afetar o sistema imunológico para garantir o ciclo vital da vespa parasitoide.

Agora, os cientistas identificaram onde estão os genes de replicação do vírus: dentro do DNA da vespa. Há cerca de 100 milhões de anos, o material genético de um nudivírus - gênero de vírus identificado recentemente - foi integrado ao genoma do inseto.

Tais genes são expressos apenas nos ovários das vespas. Eles produzem as cápsulas virais que funcionam como um cavalo de Troia: levam para dentro das células da lagarta o DNA desenvolvido pela vespa para reprogramar o sistema imunológico do seu hospedeiro.

Mistério

O coautor da pesquisa, Jean-Michel Drezen, da Universidade François Rabelais, em Tours (França), afirma que ainda é um mistério como o genoma viral foi incorporado ao DNA da vespa. Mas arrisca duas hipóteses: "Um vírus que, originalmente, causa infecções crônicas nas gônadas pode ter infectado os gametas e, ocasionalmente, se integrado ao DNA da célula", explica Drezen. "Pode ser que o nudivírus ancestral capturado pelo genoma da vespa seja transmissível sexualmente."

A outra hipótese é que o nudivírus ancestral apresente um comportamento semelhante ao de certos vírus bacteriófagos.

"Eles apresentam duas fases no seu ciclo vital: a fase lítica e a fase lisogênica", aponta o pesquisador. Na fase lisogênica, o DNA viral é integrado ao material genético da célula infectada e é duplicado durante as divisões celulares. Apenas na fase lítica são produzidas cápsulas virais e a célula morre. "Pode ser que um vírus na fase lisogênica tenha sido integrado ao genoma da vespa", afirma Drezen. Já foram identificados nudivírus que passam pelas duas fases.

"É realmente impressionante a complexidade e a perfeição das relações entre o polidnavírus e a vespa parasitoide", afirma o pesquisador emérito da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Nivar Gobbi, que estudou durante muitos anos as relações entre os dois organismos.

A pesquisa desperta também a polêmica questão da definição de um vírus. Para o estudioso Donald Stoltz, da Universidade Dalthosie, no Canadá, é "um problema semântico". "Seja lá como decidamos chamar essas entidades (os polidnavírus), o artigo mostrou que eles descendem de vírus reais", argumenta Stolz, em um comentário que acompanha o estudo publicado na Science.

Aplicação

Adilson Zacaro, da Universidade Federal de Viçosa (MG), também estuda vespas parasitoides. Ele recorda a importância de estudos como esse. "É pesquisa básica", afirma. "Mas poderá ter aplicações em ramos como a terapia gênica". No último parágrafo do artigo, os cientistas fazem referência a essa esperança. Recentemente, o Brasil produziu células-tronco pluripotentes induzidas com o auxílio de vetores virais. "O maior desafio é obter vetores seguros, ou seja, que não promovam uma infecção", explica Zacaro.

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