Assim que atendeu a uma família norte-americana que almoçava em um restaurante da rodovia Katy, próximo ao centro de Houston, a garçonete se virou e falou em espanhol com um outro funcionário do local, tipo de cena bilíngüe que se pode ver em todos os cantos da maior cidade do Texas. Ex-colônia espanhola e vizinho do México, o estado é o segundo do país com maior percentual de população de origem latina, mas poucos dos latinos têm os mesmos direitos dos outros "norte-americanos".
"A população de origem latina é muito grande, mas a maior parte dela é formada por imigrantes, e só 20% deles se tornam cidadãos com direito a voto", explicou ao G1 Nestor Rodriguez, professor de sociologia da Universidade de Houston e diretor do Centro de Pesquisas sobre Imigração. "A população é grande e impressionante, mas seu impacto está mais no mercado de trabalho e de consumidores. Quando falamos em voto, eles não têm muita força, pois não são cidadãos", completou.
Mais de um terço da população de 23,5 milhões de texanos (17 milhões com idade para votar) é de hispânicos. O Texas só perde em percentual de latinos para o Novo México, que tem 44%, mas a população deste segundo é de menos de 2 milhões de pessoas, tornando-se menos relevante no contexto do país. O próprio nome do Estado vem de "Tejas", pronúncia espanhola da palavra "amigos" em idioma indígena.
O perfil do eleitorado, entretanto, é diferente. A população com direito ao voto no Texas é majoritariamente branca e de origem européia, e somente cerca de 17% dos votos são de latinos.
Força invertida
"Há uma diferença entre tamanho e força política, e o Texas só é um estado republicano porque os latinos não podem votar", disse Rodriguez, justificando o fato de os democratas não vencerem uma eleição presidencial no estado desde os anos 1970 e de John McCain ter mais de 10 pontos de vantagem sobre Obama nas pesquisas sobre intenção de voto deste ano. "Se não fossem os latinos do Texas, McCain estaria vencendo por uma margem ainda maior."
Segundo ele, o interesse por uma política que proteja os trabalhadores costuma aproximar os norte-americanos de origem latina do Partido Democrata. Mesmo assim, eles não conseguem reverter a força dos norte-americanos mais tradicionais, que podem votar e defendem o conservadorismo republicano.
A presença de um grande número de latinos sem direito a voto acaba tendo efeito político oposto ao que seria o interesse deles. Ao aumentarem a população do Texas, o Estado ganha força política nacional, mais votos no Parlamento e até no Colégio Eleitoral, tudo seguindo a vontade definida pelos eleitores conservadores. "No fim das contas, é como se eles ajudassem os republicanos, pois dão mais força ao estado republicano, por mais que prefiram os democratas", disse o professor.
Poder decisivo
Se muitos não conquistam cidadania para votar e reverter a desvantagem democrata no Texas, os latinos vão ter uma força decisiva nas eleições deste ano em alguns estados em que as pesquisas mostram que nenhum dos candidatos tem uma liderança expressiva.
Segundo a ONG Voto Latino, 46 milhões de habitantes do país têm origem hispânica, e 17,9 milhões têm direito de votar. Na Flórida, por exemplo, onde pesquisas mostram que Obama lidera por apenas dois pontos percentuais, 12% dos eleitores registrados têm origem latina. Os latinos também estão entre os responsáveis pela liderança confortável dos democratas no Novo México e no Colorado.
Política de imigração
Um dos temas políticos mais importantes para esses latinos que vivem no Texas e no resto dos Estados Unidos é justamente a política de imigração defendida pelo próximo presidente norte-americano.
A população do Texas, a maioria de brancos e mais conservadores, é contra projetos de lei de anistia para imigrantes ilegais. "Eles se sentem incomodados pela presença de tantos imigrantes, que ocupam parte do mercado de trabalho, e têm uma visão negativa da imigração", explicou Rodriguez.
Segundo ele, o tema é delicado e os candidatos parecem querer fugir dele durante a campanha, para evitar incomodar possíveis eleitores pró ou contra a imigração. "Nem Obama nem McCain detalharam as propostas deles para a imigração. Há algum tempo, McCain propôs uma lei semelhante à de Bush, incentivando o convite a trabalhadores imigrantes em determinadas áreas e a legalização dos que estão sem documentos. Obama não fez nada assim, mas já votou com os democratas a favor de projetos que favoreciam os imigrantes", explicou.
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