Toda as manhãs, às 5h30, Liu Desheng se junta a uma dúzia de aposentados que esperam o ônibus expresso para o centro de Pequim nesta pequena cidade na província de Hebei. Eles ficam na frente da longa fila, mas não embarcam.
Por volta das 6h30, chegam seus filhos adultos. A fila, que agora serpenteia pela rua, significa uma hora de espera. Começa uma série de empurrões. Porém, os aposentados pouparam seus filhos dessa provação. Quando o ônibus seguinte encosta, os jovens adultos tomam o lugar de seus pais e embarcam, sentando-se para uma viagem de 40 quilômetros que pode levar até três horas.
“Não há muito que eu possa fazer para contribuir para a família”, disse Liu, 62, enquanto seu filho acenava pela janela do ônibus. “Ele fica exausto todos os dias, por isso se eu puder ajudá-lo a ficar um pouco mais descansado, farei isso.”
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Leia a matéria completaHá décadas, o governo da China tenta limitar o tamanho da capital, Pequim, por meio de rígidas autorizações de residência. Agora, o governo planeja um ambicioso projeto para fazer de Pequim o centro de uma nova supercidade de 130 milhões de pessoas. A megalópole projetada se estenderá por 212 mil km2 e deverá remodelar a economia do norte da China.
“A supercidade é a vanguarda da reforma econômica”, disse Liu Gang, professor na Universidade de Nankai, em Tianjin, que assessora governos locais. “Ela reflete as visões da alta liderança sobre a necessidade de integração, inovação e proteção ambiental.”
A nova região ligará as instalações de pesquisa e cultura criativa de Pequim com a cidade portuária de Tianjin e o interior da província de Hebei.
Neste mês, o governo municipal de Pequim anunciou sua parte do projeto, prometendo transferir para o interior grande parte de sua burocracia, assim como fábricas e hospitais, num esforço para compensar os estritos limites de residência na cidade, reduzir os congestionamentos e espalhar empregos bem remunerados a áreas menos desenvolvidas.
Jing-Jin-Ji, como é chamada a região, deverá ajudar a área a acompanhar cinturões econômicos mais prósperos da China, como o delta do rio Yangtze, ao redor de Xangai, e Nanquim, no centro do país.
Diferentemente de áreas metropolitanas que cresceram de forma orgânica, Jing-Jin-Ji seria uma criação deliberada. Sua peça principal: uma expansão do trem de alta velocidade para colocar as grandes cidades a uma hora de viagem umas das outras. Porém, a construção de novas estradas e ferrovias ainda levará anos. Para muitas pessoas, a criação da supercidade, por anos, significará apenas mais tempo no transporte.
Incentivadas pelas políticas de residência relativamente abertas e pela habitação barata na província de Hebei, as pessoas estão acorrendo para subúrbios como esse. Yanjiao cresceu dez vezes em uma década, chegando a 700 mil habitantes. Mas ainda é uma cidade-dormitório para Pequim —torres de apartamentos com poucos serviços.
Muitos acreditam que os problemas de transporte serão solucionados. Um metrô e um trem leve têm inauguração planejada para daqui a três ou quatro anos, e uma nova ponte para Pequim está em construção. Mais preocupante para muitos é a escassez de hospitais e escolas. “Tudo o que vemos são cada vez mais pessoas chegando aqui”, disse Zheng Linyun, que trabalha em Pequim e viaja cerca de cinco horas por dia. Seu filho de seis anos acaba de começar a escola elementar e tem mais de 65 colegas em sua classe.
Apesar de os prédios habitacionais idênticos, de 25 andares, se espalharem monotonamente pelo horizonte, há muito comércio, algumas ruas são arborizadas e o ar é muito mais limpo que o de Pequim. No entanto, a cidade não tem terminais de ônibus nem cinemas e oferece apenas dois pequenos parques. “As ruas ficam alagadas quando chove, porque não há boa drenagem”, disse Xia Zhiyan, 42, empregado de uma gráfica.
Sem impostos sobre imóveis, as cidades chinesas dependem da venda de terrenos públicos para sua receita. Os municípios não podem ter outros impostos captados localmente. Por isso, cidades como Yanjiao não têm como financiar novas escolas, estradas ou ônibus.
Apesar dos problemas, vários fatores estão transformando Jing-Jin-Ji em realidade. O mais imediato é o presidente Xi Jinping, que apresentou um plano ambicioso de reformas econômicas em 2013 e aprovou a integração da região.
O plano atribui papéis econômicos específicos às cidades: Pequim deverá se concentrar em cultura e tecnologia. Tianjin será uma base de pesquisas industriais. O papel de Hebei está indefinido, mas o governo recentemente divulgou um catálogo de pequenas indústrias a ser transferidas de Pequim para cidades menores.
Melhorar a infraestrutura será fundamental. Wang Jun, historiador do desenvolvimento de Pequim, disse que criar a nova supercidade exigirá uma completa reformulação da atuação dos governos, incluindo a instituição de impostos territoriais e a permissão para que os governos locais os administrem. Só assim essas cidades poderão ser mais que provedoras da capital. “É um projeto enorme e complexo”, disse Wang. “Mas, se tiver sucesso, mudará o norte da China.”