Quando for escolher se o presidente deve ou não ter o direito de se candidatar indefinidamente à reeleição, no referendo do próximo domingo (15), a população da Venezuela ainda não vai ter sentido efeitos mais duros da crise financeira que se espalhou pelo mundo desde os últimos meses do ano passado.
Analistas políticos apontam que o referendo está sendo realizado logo a fim de evitar que a crise "contamine" os votos. Com a economia totalmente dependente do petróleo, o país pode sofrer com a queda no valor do produto no mercado internacional (que chegou a custar US$ 147 por barril e agora não chega a US$ 40).
"O referendo poderia ter sido marcado para julho, ou dezembro, mas até lá os efeitos da crise vão ser mais sentidos do que hoje", disse, em entrevista ao G1, o economista Pedro Silva Barros, que pesquisa a importância do petróleo para o governo Chávez. Na Venezuela, fala-se que Chávez quis antecipar a votação para evitar que a crise diminua sua força política.
O presidente sabe bem a importância do petróleo para a economia e da economia para a popularidade do governo. O próprio Chávez foi eleito em 1999 após o enfraquecimento do presidente da época por conta de uma crise no petróleo. "A baixa do petróleo o ajudou, contribuindo para que um azarão pudesse surpreender", disse Luciano Wexell Severo, superintendente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela. Segundo ele, entretanto, o momento atual é mais favorável ao governo, que já enfrentou duras crises durante os últimos dez anos.
"Até 2004, a Venezuela recebeu, per capita, menos recursos pelas exportações de petróleo de que os cinco governos anteriores a Chávez. Isso significa que, no momento mais crítico da economia venezuelana, entre 2002 e 2003, uma crise que derrubou vários líderes na América Latina não conseguiu tirar Chávez do poder. Até 2004, Chávez não se manteve no poder por conta do petróleo. O que ele representa politicamente é mais profundo de que essa questão do petróleo, já está enraizado no país", disse.
Blindagem
Para Severo, que é formado em economia e viveu de 2004 a 2008 na Venezuela trabalhando em programas do governo, Chávez conseguiu proteger a Venezuela ao investir de forma inteligente os recursos do petróleo durante a alta do produto no mercado internacional.
"Chávez construiu um colchão financeiro, com reservas internacionais de US$ 50 bilhões. O governo sempre trabalhou com orçamentos que estipulavam o petróleo muito abaixo do valor com que era negociado internacionalmente. A diferença permitiu a criação de um colchão, que garante a segurança financeira do país", alegou.
Mais reticente, Barros, que é professor da PUC-SP e faz doutorado sobre o tema na USP admite que há uma intenção do governo de criar um colchão de proteção contra a crise, tentando blindar o país contra as variações do preço do petróleo, mas diz que o que foi feito ainda é menos de que o que precisaria para se proteger.
"A Venezuela não está blindada contra a crise e vai sentir os efeitos dela mais profundamente de que outros países, como o Brasil, pela própria estrutura, pela natureza da economia do país. Trata-se de uma economia muito mais aberta de que a brasileira, mais dependente dos mercados internacionais", disse. Segundo ele, o país continua tão dependente do petróleo quanto se tornou desde a década de 20. Desde a década de 70, o produto responde por 75% das exportações do país. "Além disso, o petróleo é muito importante para a arrecadação do Estado venezuelano. Uma queda no preço do petróleo diminui a arrecadação do Estado."
Avanços
Além do referido "colchão" de proteção financeira, os dois pesquisadores brasileiros defendem a atuação do governo chavista, no poder há dez anos no país, na melhora da qualidade de vida da população do país. Durante as entrevistas, os dois mencionaram que a Venezuela ultrapassou o Brasil no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, calculado pela ONU numa equação que reúne expectativa de vida, educação e riqueza.
"O avanço é fruto de um investimento do governo em educação e em saúde, buscando aumentar a expectativa de vida. No passado, outros governos tiveram dinheiro para fazer o investimento, mas não fizeram. O Brasil, sem tanto petróleo, tem muito mais dinheiro para investir na qualidade de vida de que a Venezuela ao longo dos últimos anos", disse Barros, rejeitando a ideia de que o avanço se deu apenas por conta da alta do petróleo até o ano passado.
A tese é defendida também por Severo. "O IDH da Venezuela cresceu como nenhum outro país que tenha força da alta do petróleo. Nem mesmo na Rússia houve uma evolução do IDH como na Venezuela. De 2004 a 2007, é visível o aumento do índice de desenvolvimento humano no país, por conta de investimentos em educação, saúde e na renda média da população. Isso mostra que o país aproveitou de forma positiva os recursos do petróleo."
Mais entusiasta, do chavismo, Severo menciona números que apontam que, mesmo na crise, a Venezuela pode continuar crescendo mais de que o resto do mundo. "O FMI previu para 2009 um crescimento da economia global de 0,5%. A América Latina deve crescer 2%. Enquanto isso, fala-se em crescimento de 3% na Venezuela em 2009, e alguns analistas acham que pode ser ainda maior. Claro que a oposição pode usar a crise para fazer propaganda, mas acho difícil que se sintam os efeitos da crise. Não há elementos concretos que apontem para um desastre", disse.
E ele vai além: "A Venezuela pode até ser interpretada como um bom exemplo frente à crise. A Venezuela adotou um controle de capitais, um controle de câmbio, ela estimula o mercado interno, e também freou a especulação financeira desordenada."
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