Numa das fotos do dia da posse presidencial, parece que o tamanho do público está no olho de quem vê – e vota. Essa foi a descoberta de um novo estudo que perguntou aos eleitores dos EUA qual das duas imagens – da cerimônia de posse do presidente Donald Trump na sexta-feira passada ou da de Barack Obama em 2009 – tinha um público maior.
Para os pesquisadores, a resposta era visivelmente clara. Foi a posse de Obama em 2009. Mas um a cada sete eleitores de Trump discordou, uma conclusão que os pesquisadores dizem que poderia ser o resultado do que chamaram de “resposta expressiva”, um tipo de comportamento de torcida organizada partidário. Nas pesquisas, os voluntários às vezes forneceram respostas que não são factuais, mas que demonstram apoio por um político ou partido.
“Essas pessoas estão basicamente dizendo, ‘Eu sei que não tem mais pessoas nesta foto do que na outra, mas também sei o contexto da pergunta’”, diz Brian Schaffner, cientista político da University of Massachusetts, em Amherst, que realizou o estudo com Samantha Luks, diretora administrativa de pesquisa científica do YouGov. “‘Eu basicamente escolhi mentir só para apoiar Trump’”.
Num primeiro relance, os resultados da pesquisa oferecem uma visão lúgubre das percepções partidárias. Republicanos e democratas não conseguem nem chegar a um acordo quanto a evidências fotográficas, que dirá no tocante a criação de políticas, diz o Dr. Schaffner.
Mas o estudo também oferece revelações quanto à motivação por trás dessas discordâncias factuais. Cientistas e psicólogos políticos concordam que são complexos os mecanismos que impulsionam essa discórdia. Eles dizem ser provável haver uma combinação de múltiplos fatores: o comportamento de torcida partidária, uma desconfiança em relação à mídia e como ela apresenta (ou distorce) os fatos, e um desconhecimento do debate político, que é somado a uma disposição, no entanto, para dar uma resposta que possa apoiar, de qualquer modo, o seu próprio time político. Na pesquisa, os 1.388 voluntários, todos eles adultos americanos, viram duas imagens justapostas. Na esquerda, havia uma visão aérea da cerimônia de posse de Trump, da perspectiva de perto do topo do Monumento a Washington; na direita, uma imagem, daquela exata mesma perspectiva, de oito anos atrás, durante a cerimônia de Obama. As fotos justapostas foram, é claro, a mesma imagem que viralizou na sexta-feira, e que a administração Trump afirmou, no dia seguinte, ser um caso de “reportagens deliberadamente falsas” da “mídia desonesta”.
Os voluntários, alguns dos quais provavelmente sabiam do atrito entre Trump e a imprensa, responderam a duas perguntas no domingo e na segunda-feira sobre as fotos. Metade deles recebeu a pergunta: qual das duas fotos foi tirada na posse de Trump e qual foi tirada na de Obama? Quarenta e um por cento dos eleitores de Trump deu a resposta errada, contra os 8% dos eleitores de Clinton e 21% dos não eleitores.
A outra metade dos participantes recebeu uma pergunta mais simples: Qual foto continha mais gente? Quinze por cento dos eleitores de Trump, isto é, um a cada sete, deu a resposta errada, contra 2% dos eleitores de Clinton e 3% dos não eleitores.
Schaffner diz que os eleitores de Trump deram a resposta errada por dois motivos. É possível que alguns deles de fato enxergassem mais gente na foto de 2017. Mas o outro motivo, diz ele, é o fenômeno da “resposta expressiva”.
“Na pergunta que fizemos, a verdade era óbvia e estava bem na frente das pessoas. É realmente impossível que elas acreditassem que havia mais gente na foto da esquerda”, diz ele. “A única explicação é que os 15% sabiam já que o que estavam dizendo era errado. Mas eles escolheram a resposta errada ainda assim, para apoiar Trump”.
Esse comportamento político de torcida organizada, no entanto, se aplica tanto aos democratas quanto aos republicanos. Numa pesquisa de 1988, o Estudo Nacional Eleitoral Americano da University of Michigan, 30% dos democratas disse que o desemprego havia piorado durante a presidência de Ronald Reagan – o que não era verdade. O desemprego, de fato, havia caído em seu governo.
“Em outras palavras, quando você faz perguntas sobre a economia para as pessoas, as respostas são menos uma declaração de objetividade e mais algo como o que elas diriam se você lhes perguntasse qual é o melhor time de futebol”, escreveu Neil Irwin no caderno The Upshot, do New York Times em 2014.
Mas Howard Lavine, psicólogo político da University of Minnesota, diz que há outra camada ainda na discussão. Além de responderem com base na ignorância ou na lealdade à sua equipe política, os participantes também poderiam estar confusos entre os fatos verificados sobre as multidões que lhes foram apresentados pela imprensa e as declarações não confirmadas feitas pela administração Trump.
“Agora eu acho que estamos entrando num domínio em que as pessoas infelizmente estão confusas de verdade”, diz o Dr. Lavine, diretor do Centro de Estudos de Psicologia Política da universidade, que não teve envolvimento com o estudo. “Os republicanos de orientação populista vêm dizendo isso faz um tempo já. ‘Não confiem na mídia em geral. Ela mente para vocês’... É possível que os participantes acreditem que isso seja verdade – que eles estão recebendo mentiras. O que isso significa, então, é que eles acreditam de fato na resposta que deram”.
Enquanto as imagens das duas posses viralizavam, elas também foram apanhadas por outras agências de jornalismo. Segundo o editor da Reuters encarregado pela agência para fazer a cobertura fotográfica, havia três operadores de câmera na altura do Monumento a Washington. Um era da Reuters, outro da CBS e outro do National Park Service. A “NewsHour” da PBS também publicou um vídeo de time-lapse do público ao longo do dia da cerimônia de posse.
Mas Trump disse na sede da CIA no sábado que “a mídia desonesta” mostrou imagens de espaços vazios, enquanto o secretário de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, acusou jornalistas de publicarem “reportagens deliberadamente falsas”. Além do corpus crescente de pesquisas que mostram como políticos e elites políticas são eficientes em espalhar teorias conspiratórias entre seus apoiadores, as acusações de Trump e Spicer apontam como a confiança na mídia está historicamente no seu ponto mais baixo.
Como é que essas duas imagens, então, se encaixam nesse contexto maior da divisão partidária?
A perspectiva não é boa, dizem os especialistas em psicologia e ciência política. Patrick Miller, cientista político da University of Kansas, também sem envolvimento com o estudo, diz que isso mostra como democratas e republicanos vivem em mundos completamente distintos, com notícias e fatos diferentes. O Dr. Lavine também acrescenta que os eleitores andam se sentindo cada vez menos motivados em apoiar políticas que lhes sejam benéficas e mais preocupados com a vitória ou derrota do seu time. Mas ele acrescenta que, na década de 1950, a American Political Science Association lamentava o oposto, que os partidos eram, na verdade, ideológicos de menos. Havia muitos democratas conservadores e republicanos liberais, segundo os relatos. Hoje, parece que o contrário é verdadeiro.
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