O futuro da campanha de Bernie Sanders, que criou um movimento de esquerda conquistando os jovens americanos, pode ser decidido nesta quinta-feira (9) na Casa Branca. O senador por Vermont, dono de 12 milhões de votos nas primárias, se encontrará com o presidente Barack Obama sob pressão para apoiar Hillary Clinton, que garantiu numericamente a candidatura democrata para as eleições de novembro. O desafio é fazer isso sem trair a legião dos seguidores, ainda mais depois que o senador ensaiou um caminho que poderia abrir a interpretação para sua desistência, mas depois acabou conclamando seus apoiadores a continuarem na luta por sua “revolução política”. Mas até seus voluntários, que fizeram a diferença na campanha, já sentem o desânimo.
Emocionado, Sanders falou na madrugada de ontem na Califórnia, onde teve resultados piores do que era previsto pelas pesquisas. Quando parabenizou a democrata, colega de partido, pelas vitórias obtidas, o público presente vaiou mais que quando foi dito o nome do rival Donald Trump, indicando o grau de rejeição a Hillary e os problemas que ela terá para unir a legenda. Para analistas, ao mesmo tempo que deixou a porta aberta para apoiar a adversária, também reforçou o discurso de sua candidatura:
“Isso é mais que sobre apenas Bernie Sanders, isso é sobre todos nós juntos”, disse o senador, que ao fim de seu discurso, contudo, voltou a encorajar seus apoiadores. “Vamos lutar muito para vencer a primária de Washington e, então, vamos levar a nossa luta por justiça social, econômica, racial e ambiental a Filadélfia (que receberá a convenção do partido, no fim de julho). Vamos continuar a lutar por cada voto e cada delegado.”
A última prévia, contudo, define apenas 20 votos no Colégio Eleitoral, que não fará nenhum diferença no cenário. Após as primárias de terça-feira, quando seis estados foram às urnas, Hillary conta com 2.777 delegados, segundo o “New York Times”, com grande folga sobre os 2.383 necessários para garantir a nomeação. Excluindo os 712 superdelegados – os políticos da elite do partido que votam livremente na convenção e que apoiaram maciçamente a ex-secretária de Estado e representam 14,9% do total – Hillary tem 2.203 delegados. São só 180 a menos que o necessário, contra 1.828 de Sanders. A diferença entre os dois, que era de 290 delegados, subiu para 375 após a última Superterça.
‘Clima de despedida’
Hillary venceu em 28 estados, contra 22 de Sanders. A ex-primeira-dama também leva vantagem no total de votos populares, tendo recebido o apoio de 15,7 milhões, contra 12 milhões para o senador. Ou seja, venceu em todos os aspectos – e já iniciou o foco total contra Donald Trump. O maior golpe no senador, contudo, foi a derrota na Califórnia. Ela venceu por uma vantagem de 12,6 pontos percentuais, muito acima da ligeira vantagem de dois pontos que as pesquisas apontavam nos últimos dias antes da disputa.
O “New York Times” afirmou que a campanha de Sanders já dispensou grande parte de sua equipe ontem. Um voluntário da campanha do senador em Washington, que pediu pra não ser identificado, afirmou que o que mais pesou foi a derrota na Califórnia. O grupo contava com uma vitória no principal estado do país para continuar com argumentos para seguir lutando.
“Agora sabemos que nosso ideal é melhor, mas não temos meios de comprovar que ele foi aceito pela maioria da população. É triste, acredito que o evento desta quinta-feira (hoje) aqui em Washington terá mais um clima de despedida que um clima de empolgação”, disse ele ao GLOBO.
Nada deve ocorrer, contudo, antes do encontro de Sanders com Obama, previsto para o fim da manhã de hoje. Segundo Josh Earnest, porta-voz da Casa Branca, o presidente “respeita a decisão de Sanders sobre a própria campanha”. Para ele, nenhuma expressão de apoio a Hillary de Obama será pública antes do encontro.
“Acredito que o presidente certamente vai parabenizar o senador por sua campanha extraordinariamente bem-sucedida. Ele conseguiu dinamizar não apenas milhões de americanos em todo o país, sejam democratas ou independentes, mas também conseguiu mobilizar uma nova geração de ativistas políticos”, disse Earnest.
Esta agenda é o que mais dificulta o embarque de Sanders na campanha de Hillary. O senador passou grande parte da disputa criticando o sistema político, afirmando que a rival é próxima dos interesses de Wall Street e que o país “precisa de uma revolução”. Não será fácil mudar de posição sem parecer uma traição à causa que defendeu até agora. Uma agenda mínima para Hillary – que já fez uma campanha muito mais à esquerda que o habitual – deve ser uma das condições para seu apoio. E como Sanders prometeu que participaria das derradeiras primárias democratas na terça-feira, muitos acreditam que ele não tomará nenhuma decisão até lá.
Hillary levou mais tempo
Em 2008, Hillary demorou quatro dias para apoiar formalmente o então candidato Barack Obama, mesmo tendo muito menos a perder que Sanders atualmente. Além de suas propostas mais radicais, ele tem 74 anos e dificilmente terá fôlego para mais uma campanha presidencial daqui a quatro ou oito anos – caso Hillary se consagre nas urnas.
Outros democratas, segundo o “Washington Post”, afirmam que Sanders pode ficar com a fama de intransigente se insistir na campanha mesmo sem chances reais de vitória e sob o risco de favorecer Trump. A senadora Claire McCaskill disse que ele é necessário para incentivar os jovens a votarem em Hillary:
“Eu sei que ele se preocupa profundamente com a possibilidade de deixar Donald Trump perto dos controles das armas nucleares”, disse.
A campanha de Hillary já veicula peças na TV que mostram Trump ridicularizando um repórter com deficiência física, com pais de deficientes criticando o magnata. Em outra propaganda, americanos de todas as origens, religiões e condições a apoiam, um contraste com a imagem de segregação dos discursos do republicano.
“As pessoas precisam dormir um pouco, acordar e pensar sobre o rumo a seguir”, disse Robby Mook, gerente de campanha de Hillary, à CNN.
O republicano, que acenou nesta semana aos eleitores independentes de Sanders que se sentiam frustrados “pela decisão dos superdelegados”, não é o único a cortejar o senador e seus milhões de votos. Segundo o “New York Times”, líderes dos partidos Verde e Libertário também acenaram aos independentes anti-Hillary.
Apesar das ressalvas quanto a Trump, muitos republicanos de olho num retorno à Casa Branca tentam mediar uma forma de tornar o magnata mais amigável. O bilionário deverá ter uma reunião hoje, em Nova York, com os maiores doadores do Comitê Nacional Republicano.
Moraes eleva confusão de papéis ao ápice em investigação sobre suposto golpe
Indiciamento de Bolsonaro é novo teste para a democracia
Países da Europa estão se preparando para lidar com eventual avanço de Putin sobre o continente
Em rota contra Musk, Lula amplia laços com a China e fecha acordo com concorrente da Starlink