Trabalhador colhe tomates em Manschnow, na Alemanha, país mais afetado pelo surto causado pela bactéria E. coli e que sofreu forte queda na venda de produtos vegetais| Foto: Johannes Eisele/AFP

Comércio

Alemanha rejeita pânico, mas vendas agrícolas têm queda

Enquanto cientistas e autoridades fazem trabalho de detetive para descobrir o que é e de onde veio o surto infeccioso que já deixou 18 mortos na Alemanha, Berlim rejeita o pânico e a paranoia.

Em um mercado de produtos orgânicos no bairro classe média alta de Prenzlauer Berg, a vendedora se ofende com a deliberada provocação: "De onde vem o pepino que vocês estão vendendo?’’.

"Não é da Espanha, é tudo da Alemanha’’, responde irritada. Lembrada de que os pepinos espanhóis foram "inocentados’’ e de que não se sabe a fonte de contaminação, rebate: "Mais um motivo para não deixar de consumir’’.

Um cliente interrompe para opinar que as pessoas não devem se contaminar pelo "medo incutido pela mídia’’.

Ali perto, numa mesinha, quatro jovens têm os seus pratos cheios de alface, pepinos e tomates crus – fontes potenciais de contaminação. "Nem lembramos que tinha essa bactéria’’, diz um deles.

Em outro restaurante, a garçonete diz que segue servindo saladas como de costume, mas que a casa retira ingredientes se solicitado.

Mas o clima nas ruas contrasta com números oficiais.

Segundo a consultoria de mercado de produtos agrícolas AMI, na última semana a venda de pepinos caiu 40%. Também sofreu redução a venda de alface (30%), tomate (20%) e pimentão (15%). No norte, onde o surto teve início, 90% da produção corre o risco de ser perdida.

Boicote russo

A Rússia anunciou ontem um veto total à importação de vegetais crus de todos os países da União Europeia, atitude considerada "desproporcional" pelo bloco, que deve exigir justificativas formais. A Rússia já havia banido os vegetais da Alemanha e da Espanha por causa do surto.

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Berlim - O surto infeccioso que já matou 19 pessoas e deixou perto de 2 mil doentes na Europa está sendo provocado por uma variedade inédita e "supertóxica’’ da bactéria Escherichia coli (E.coli), disseram ontem cientistas e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

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A infecção continua a se alastrar: são 11 os países atingidos. Ontem, o Reino Unido confirmou os seus sete primeiros casos. Três são britânicos que estiveram na Alemanha, e os demais são alemães. Com 18 mortos, a Alemanha é o centro do surto.

Também ontem os EUA confirmaram três casos da doença no país, no primeiro registro do surto fora do continente europeu.

Cientistas do laboratório de biotecnologia BGI, na China, e do Centro Médico Universitário de Hamburgo-Eppendorf (UKE), na Alemanha, fizeram em conjunto um mapeamento genético preliminar da bactéria.

Eles detectaram uma mutação de duas formas distintas da E.coli, com genes altamente letais, resistentes a antibióticos e que produzem a chamada síndrome hemolítico-urêmica (HUS, em inglês), causa de complicação renal.

"Trata-se de variante que nunca havia sido isolada em pacientes’’, disse Hilde Kruse, especialista em segurança de alimentos da OMS. Segundo ela, a bactéria contém "várias características que a tornam mais virulenta e a fazem produzir mais toxinas’’.

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Segundo o UKE, cerca de 30% de pessoas infectadas desenvolveram sintomas de HUS, o que é considerado uma proporção altíssima – o usual é entre 5% e 10%.

Autoridades da região de Hamburgo, no norte da Alema­nha, onde o surto teve início, chegaram a apontar pepinos de origem espanhola como fonte da infecção. Mas testes praticamente descartaram a suspeita.

Agora, alemães admitem que não só não fazem ideia de qual seja a origem da infecção como acham que nunca vão descobri-la. "Talvez nunca encontremos a fonte exata’’, afirmou Reinhard Burger, chefe do Instituto Robert Koch, a agência alemã de controle de doenças.

"Tamanho número de casos severos significa que houve imensa contaminação em algum momento’’, disse Denis Coulombier, chefe do Centro Europeu de Controle e Prevenção de Doenças.

"Isso pode ter acontecido em qualquer ponto da cadeia entre a fazenda e o garfo – no transporte, no empacotamento, na limpeza, na distribuição ou nas lojas.’’

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Permanece a recomendação de que se evite a ingestão de legumes e hortaliças crus.

Reações

O governo da Espanha voltou a dizer ontem que pedirá "ressarcimento dos danos’’ provocados pelo "clamoroso erro’’ alemão de vincular o surto ao pepino espanhol. Segundo Madri, as perdas ultrapassam 75 milhões de euros.

"Vamos exigir reparação pelos danos causados perante as instâncias europeias’’, disse o premiê espanhol, José Luis Rodrí­guez Zapatero.

Já a Rússia decidiu proibir a importação de todos os tipos de vegetais frescos vindos da União Europeia, que qualificou a decisão de "desproporcional’’. Já vigorava um veto russo a legumes da Espanha e da Alemanha.

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