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No fim do mês passado, os britânicos decidiram, por referendo popular, deixar a União Europeia (UE). Apesar de a totalidade e profundidade das consequências desta decisão ainda serem incertas, pode-se observar alguns efeitos imediatos e potenciais da mesma.

No Reino Unido, em termos geracionais, cria-se um ambiente em que os mais jovens sentem que os mais velhos lhes inibiram o futuro. Enquanto estes votaram maioritariamente pela saída da UE, entre os mais jovens a opção foi pela permanência e usufruto de toda a facilidade de circulação que o bloco europeu permite e que eles já não dissociam de sua própria identidade.

Um significativo fluxo de capital já saiu do Reino Unido e grandes corporações também planejam sair do país

Na esfera política, a decisão levou David Cameron a anunciar sua renúncia ao cargo de primeiro-ministro – sua saída será oficializada na quarta-feira e, a partir do dia 14, sua colega de partido Theresa May assume o governo. Contudo, nesta esfera o efeito mais drástico tem a ver com Escócia, Irlanda do Norte e Gibraltar. Todos votaram em massa pela permanência na UE. Nicola Sturgeon, primeira-ministra da Escócia, advoga por outro referendo sobre a independência escocesa. Martin McGuinness, vice-primeiro-ministro da Irlanda do Norte, fala na possibilidade de referendar a reunificação irlandesa. Portanto, não é descabido pensar na fragmentação do Reino Unido em um futuro breve. Já Gibraltar, onde 95% da população votou pela permanência, deseja ficar na UE e no Reino Unido.

Na esfera econômica, o efeito mais imediato foi a acentuada queda nas bolsas pelo mundo e a expressiva desvalorização da libra esterlina. Frente ao dólar, a moeda atingiu o ponto mais baixo em mais de três décadas. Perspectivando não ter mais acesso irrestrito ao mercado europeu, um significativo fluxo de capital já saiu do Reino Unido e grandes corporações também planejam sair do país. Isso é preocupante para Londres pois, mesmo votando em peso contra a saída da UE, a cidade pode perder sua importância como hub das finanças internacionais. A decisão de saída impacta, inclusive, a inserção britânica no comércio internacional, uma vez que a mesma pode tirar o país do tratado de livre comércio em negociação entre a UE e os Estados Unidos.

No plano regional, a saída britânica fortalece os partidos eurocéticos em diferentes países. Já se observa tais partidos argumentando por referendos semelhantes, por exemplo, na França e na Holanda. Além disso, a decisão de saída da UE diminui drasticamente a influência britânica nas decisões políticas no continente europeu, algo que, mesmo a distância, a ilha sempre buscou ter. Esta saída representa uma forte guinada na política externa britânica, de pelo menos meio século, de crescente adensamento econômico com o continente europeu. O país candidatou-se para entrar na Comunidade Econômica Europeia em 1961, sendo vetado pela França, e tornou-se membro da mesma em 1973.

A decisão britânica é o maior revés sofrido pelo processo de integração regional europeu. Contudo, ela deve ser lida pela liderança europeia como uma clara resposta ao tipo de integração até agora em curso, em que os cidadãos veem-se longe dos processos decisórios mais importantes e os destinos do bloco são deliberados por burocratas. Resta saber se a liderança da Europa, sobretudo de França e Alemanha, estará à altura de pensar e reconstruir uma nova Europa. Os indícios, até o momento, levam a sérias dúvidas quanto a isso.

Ramon Blanco, doutor em Relações Internacionais, é professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) e colaborador no Programa de Pós-Graduação em Ciência Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR).
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