A balança do equilíbrio entre os poderes perdeu o tom, emitindo notas de desafino. A quebra da harmonia tem sido tão estridente que é impossível ignorar a tensão que invade a atmosfera pública a cada ato do espetáculo. Apesar de todos os esforços, o maestro parece perder o controle da regência, sendo cogente uma retomada dos princípios que fundam a condução de uma ordem plural em ritmo de unidade sistêmica. Enfim, quando a realidade grita, a linguagem figurada muito pode falar.
Ora, diante de um quadro de grave instabilidade no Executivo e no Legislativo, algumas questões genuinamente políticas começaram a ser endereçadas diretamente ao Supremo Tribunal Federal, que, uma vez provocado, se sente no dever de prestar jurisdição. A consequência do fenômeno está aí aos olhos de todos: estamos presenciando uma aguda hipertrofia das funções da suprema corte, expondo os juízes constitucionais brasileiros a delicadíssimas questões de primária natureza político-parlamentar.
Sim, a dinâmica do jogo institucional permite fluxos e influxos decisórios. Acontece que, em tese, o colendo STF deveria ter uma posição de absoluta reserva estratégica, somente vindo se manifestar com base em firmes fundamentos jurídicos, jamais em movediços critérios políticos. Sobre o ponto, é sabido e ressabido que a Constituição possui uma intrínseca dualidade de normas jurídicas e regras políticas que, em sua essência, definem as respectivas competências de cada poder. Ou seja, existem matérias que refogem ao âmbito do conhecimento jurisdicional, exigindo, em vez da objetividade de uma sentença togada, a fluidez reflexiva do pensamento político criador.
Cabe ao Supremo ter a prudência e moderação necessária ao equilíbrio republicano
Sobre o ponto, a clássica lição de Bryce ensina que “a Corte Suprema tem firmemente recusado intervir nas questões puramente políticas” (in purely political questions). A corroborar tal entendimento, destaca-se ainda o alto magistério de Hitchcock, Charles Elliot e Thayer. Nessas querelas, em vez do controle judicial, o que vigora, conforme as sempre sábias palavras de Ruy, são “os freios da opinião popular e da moral social”.
Infelizmente, a desmedida judicialização da política está banalizando o invulgar papel institucional do Supremo Tribunal Federal, expondo-o, indevidamente, a questões intestinas do Executivo e do Legislativo. Aqui chegando, antes de incontroláveis vaidades, precisamos voltar a elevar o espírito público superior. É hora do egrégio STF se reposicionar na estrutura do poder republicano, não permitindo ser usado por manobras jurídicas usurpadoras em favor de ajuntamentos partidários ou interesses políticos eventuais.
Em um ambiente político instável e aterrador, cabe ao Supremo ter a prudência e moderação necessária ao equilíbrio republicano. Amparando-se nos ensinamentos de Bachof, a luz intelectual do eminente professor Jorge Miranda bem aponta que “os tribunais constitucionais consideram-se não só autorizados, mas inclusivamente obrigados a ponderar as suas decisões, a tomar em consideração as possíveis consequências destas”. Logo, é dever do juiz constitucional sopesar profunda e criticamente os efeitos práticos dos seus atos, evitando a prolação de decisões impensadas que, na ânsia de querer resolver, acabam por conturbar ainda mais um ambiente nacional terrivelmente tenso e incerto.
Para ser um bom e fiel guardião da Constituição, o Supremo deve, primeiramente, saber guardar a si próprio. A exposição indevida é, antes de tudo, uma forma de vulnerabilidade. Num quadro de absoluta debilidade política, o Brasil requer um STF seguro, sereno e ponderado. Nada mais. Só e somente só. Haverá divergência ou pedido de vistas?
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