Em 15 de novembro celebrou-se a Proclamação da República do Brasil, ocorrida em 1889. Anunciada pelo marechal Deodoro da Fonseca, a deposição do imperador para a inauguração da República foi, na verdade, um golpe militar.
Em geral, entende-se que a república, como forma de governo, é preferível à monarquia, uma vez que sob a república – que vem do latim res publica, ou “coisa pública” – pratica-se as ideias da democracia, da participação política, do controle e fiscalização do poder e da permanente possibilidade de mudanças na liderança do país. De outro lado, a monarquia é o poder concentrado nas mãos de um herdeiro, “escolhido” por supostas leis divinas, com período ilimitado de governo e, dada a ausência de democracia na escolha da figura do rei, impassível de controle ou mudança pelo voto.
Na América, onde as colônias foram vítimas da conduta predatória das monarquias europeias, não há nenhum país governado por uma monarquia. Os maiores países da América, Estados Unidos e Brasil, realizam eleições periodicamente, e nem se cogita a possibilidade de retorno a um regime monárquico.
A transição foi uma reação de setores atrasados da sociedade brasileira, como os latifundiários
Mas a complexa e contraditória história do nosso país revela que a transição da monarquia para a república não foi um processo verdadeiramente progressista, em busca de uma melhor forma de governo. Na verdade, foi uma reação de setores atrasados da sociedade brasileira, como os latifundiários, insatisfeitos com as atitudes modernizadoras do Império, como a abolição da escravidão.
A República foi proclamada um ano depois da declaração da Lei Áurea, de 13 de maio de 1888. E a maior motivação da deposição do imperador foi, certamente, a insatisfação dos proprietários de escravos, que reivindicavam que a abolição da escravidão só fosse feita se houvesse indenização aos proprietários pelos seus escravos. Em síntese, os proprietários esperavam que o governo brasileiro pagasse a eles pelos seus escravos para que estes fossem libertados. Entretanto, a tese que predominou na Lei Áurea foi a de que a escravidão era um crime contra a humanidade, uma imoralidade absoluta, impassível de indenização.
Certamente havia republicanos que não estavam motivados pela reação à Lei Áurea. Na política nacional, lideranças que defendiam a proclamação da República atuavam havia décadas, chegando a eleger deputados durante o Império. Entretanto, sua força nunca tinha alcançado o patamar que permitisse a efetiva deposição do imperador.
Mas os latifundiários, novíssimos republicanos que aderiram à causa em 13 de maio de 1888, tinham essa força. Seu poder econômico e o controle territorial que detinham no país permitiram que, unidos à elite militar, tomassem à força o poder. Era inaugurada, no ato de 15 de novembro de 1889, uma república estranha. Era uma mudança de governo que propunha andar para trás. Uma proposta progressista motivada por rancores conservadores.
Assim teve início a República Velha, dominada no primeiro momento pelos militares, e por isso também chamada de República da Espada. Somente a partir dos anos 30 é que o Brasil começará a ter um esboço de república, com viés modernizante e, em alguns momentos, até democrático.
Uma verdadeira república precisaria, necessariamente, romper com os resquícios aristocráticos que persistem na sociedade, garantir o amplo acesso da população ao poder político – sem distinção de classe social, cor da pele ou gênero – e a vedação à perpetuação de famílias no poder. A verdadeira república não deveria ter dúvidas sobre os valores democráticos, e garantir dignidade a todos.
Mas, na maior parte do tempo, temos uma forma de governo vacilante, vulnerável, incompleta. Neste 15 de novembro, mais uma vez paramos para refletir que, mais de 100 anos depois da proclamação da nossa república, ainda nos faltam os valores realmente republicanos.
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