Quis a providência divina que eu tivesse de passar um tempo em São Paulo neste mesmo momento em que parece haver um problema entre São Paulo e São Pedro.
São Paulo criou para si a fama de templo do trabalho e do mau humor, mas é uma fama imerecida em ambos casos. Há pouco tempo para o trabalho por causa do trânsito e em função dele também os paulistanos demonstram diariamente seu bom humor e tolerância. Se tivessem humor normal, já teriam todos se matado. Todos paulistanos que podem, fogem daqui nos fins de semana e feriados.
Desde que as inventamos, vivemos uma relação esquizofrênica com as cidades. Elas exercem fascínio, mas precisamos também fugir delas. Foi ainda na Roma antiga que inventamos a casa de campo, mas há também as maneiras líricas de fugir das cidades. Não foi "Casa no Campo" do Zé Rodrix que inventou o gênero, nem tampouco aquela da casinha lá na Marambaia, também gravada por Elis Regina. Já na Roma antiga, Horácio cunhou a expressão fugere urbem, que depois foi requentada pelos arcadistas. As duas músicas recentes beberam nestas fontes antigas.
Tudo em São Paulo, seja vivo ou morto, cobre-se em dois dias de uma película preta colante. Carros são laváveis, mas esse particulado fino passa pelo filtro de nossas narinas e deposita-se em nossos pulmões, que não são laváveis. Respirar o ar de São Paulo significa fumar três cigarros por dia, diz o pneumologista Chin An Lin, pesquisador do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da Escola de Medicina da USP.
Para meu azar, estou terminando aqui um autodesafio de correr 540 quilômetros. Este não é um local para bufar.
Admiro a capacidade criativa dos artistas e intelectuais paulistanos. Essa cidade é um videogame permanentemente ligado. Não é possível criar com grande parte da sua cabeça envolvida em separar o ruído da informação. E haja ruído.
Essa catatonia estimula o pensamento superficial e desnecessário. Há rádios aqui dentro destinadas exclusivamente ao trânsito. E tem grande audiência. Ir de um lugar a outro aqui é um grande assunto. O que você foi fazer lá? Não importa, levou três horas para chegar!
São Paulo é mesmo uma cidade cosmopolita. A quantidade de gente é chinesa, a infraestrutura é africana, o trânsito durante as chuvas, com os semáforos apagados é indiano. As distâncias são australianas. O atendimento é de Nova York. O ar é londrino, mas a Londres da Revolução Industrial. O resultado ambiental é uma coisa inexplicável, de outro planeta.
O paulistano é, antes de tudo, um forte. Passei a admirar essa gente, mas uma vez que a providência divina permita, será de bem longe.
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