Autores idealizaram sociedades perfeitas: a Utopia de Morus, a Cidade do Sol de Campanella, a Cidade Ideal de Leonardo da Vinci, o socialismo utópico de Saint-Simon. Realizadores executaram alguns desses planos em pequena escala, como a Colônia Cecília e a Colônia Tereza do Dr. Faivre. Na macroescala, a inovação de todas as regras de convivência pública no período agudo da Revolução Francesa, com mudança do calendário, do sistema de pesos e medidas, das palavras adequadas e das banidas foram avant première das revoluções do século 20, que, partindo de um projeto, demoliram as formas de viver para construir conforme a planta que tinham em mente.
Os sonhos não acabaram; tornaram-se pesadelos. As construções foram à ruína, embora muitos finjam que os escombros são apenas fase desagradável da execução do projeto. Mudar radicalmente a forma de viver sem que haja experimentos em miniatura é muito arriscado. Os planejadores e os executores soem ser em pequeno número, membros de uma das elites, a política. A maioria, politicamente desestruturada, é massa. Os projetos do futuro mexem com essa massa e ela paga o custo.
Para a engenharia de sobrevivência, geradora de produtos como remédios, edificações, meios de transporte, combustível, alimento, processos de produção, há longos testes antes da aprovação. Por que a engenharia social, que lida com a convivência, vai direto do projeto ao produto, sem a fase de certificação da qualidade?
Aos arautos das ideias de modos de viver abrir-se-iam espaços controlados, como laboratórios para engenharia de convivência. Anarcoprimitivistas: pedaço ermo delimitado para a experiência a ser acompanhada em tempo real, semelhante a uma biosfera. Religiosos fundamentalistas: espaço similar ao de Canudos para executarem o projeto de vida monástica total. Os comunistas, que pressupõem a cooperação como forma natural de convivência e veem a competição como corrupção provocada pela propriedade privada, poderiam verificar a validade desse pressuposto.
Numa bolha, fazer microcosmo da experiência com adeptos da tese a ser ali experimentada. Os protagonistas do experimento definiriam as regras de seu projeto, como se estivessem fazendo assembleia constituinte, e viveriam a execução do plano, sentindo na pele as consequências positivas e negativas, submetendo-se ao critério científico de afirmação ou infirmação de seus pressupostos teóricos.
Várias experiências simultâneas, em ambiente laboratorial, para haver alguma convicção menos que certeza científica da melhor forma de convivência no sentido de assegurar que todos tenham oportunidades semelhantes em relação aos bens materiais, morais, culturais.
Outro mundo é possível. Qual, como, por quem, para quem? E se der errado, qual a alternativa? Como reconhecer erros e gerenciar correções? Quais custos morais, emocionais, civilizacionais são aceitáveis para implementar o projeto? O novo modus vivendi é apto a gerar civilização superior? Quantas vidas são sacrificáveis para vencer a resistência à mudança ou por erros de planejamento ou execução?
Ah, o laboratório social também é projeto utópico!