Há tempos se consolidaram estereótipos acerca da Europa: a Inglaterra é industriosa, rica e imperial; a França é chique e mal resolvida com os ingleses e alemães; estes, por sua vez, são "quadrados" mesmo encharcados de cerveja, além de operosos e mandões; a Itália, europeia no norte e africana no sul. Espanhóis e portugueses? Ué, a Europa não termina nos Pirineus? No conjunto, a Europa é percebida como ex-centro político e econômico do mundo; autofágica, se reduziu a exportador da terceira via entre o turbocapitalismo norte-americano e o capitalismo estatomafioso da Rússia e China. Bem-estar social, aposentadorias régias, assistência à saúde, seguro-desemprego, bolsa-filho para nativos e imigrantes. Do inferno nazi-fascista ao paraíso social-democrata, a Europa pauta discussões e siglas partidárias nos trópicos do Novo Mundo.
O projeto de formação dos Estados Unidos da Europa, federalizando povos que foram inimigos letais até recentemente, soa como ato de superioridade da cultura europeia sobre querelas terceiromundistas. Além de farol do socialismo não marxista e executora de ousada engenharia política, a Europa também ilumina o mundo com padrões de elegância e bom gosto. Bugatti, Armani, Dior, Bentley, Rolls-Royce, Aston Martin, Ferrari, Lamborghini, Givenchy, Mercedes, Porsche, Kenzo, Maison Chanel. Não há luxo oriundo de outra terra. Tudo isso a mantinha (de certa forma ainda mantém) no centro da atenção mundial, apesar da perda da importância diante dos Estados Unidos e da China. A moeda da união, o Euro, fazia de cada europeu um ricaço nas plagas pobres dos outros continentes. Os europeus se davam ares de superioridade, como professores plenos de sabedoria para impor lições aos alunos da periferia que persistiam na pobreza política, econômica e na breguice ao estilo yankee.
Bem, quem já se destruiu duas vezes, a ponto de precisar da esmola do Plano Marshall para sobreviver, não tem superioridade alguma. Hoje, à beira de outra derrocada, fica nítido que os europeus são iguais ao resto do mundo. Humanos, demasiadamente, se fartaram até quebrar a tesouraria. Quando fizemos algo parecido nos anos 70 e 80, as receitas de parcimônia, austeridade, vinham principalmente pela voz da Europa. As medidas a serem adotadas eram corretas como se viu ao longo do Plano Real e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Tragicômica é a porta-voz do economicamente correto estar falida porque agiu como rico de loteria e não com a prudência de quem constrói riqueza atravessando séculos.
A costura dos retalhos para cobrir as vergonhas da Europa está em andamento. Andrajos de patchwork carecem de glamour, mas vestem adequadamente quem voltou a usar lenha para se aquecer no inverno. Nova pobre, a desorientada Europa parece precisar de lições: depois da bonança vem a tempestade, portanto não gastem mais do que ganham; não permitam que a dívida pública seja maior que o PIB; o Estado não é cornucópia da fortuna de onde jorram infinitas facilidades; trabalhem mais e melhor.
Do jeito que as coisas andam em Brasília, talvez amanhã seja a nossa vez!
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