A série de indagações não respondidas e dúvidas quanto a procedimentos no acidente com o ex-deputado Fernando Carli Filho, que resultou em duas pessoas mortas , envolve também todos os radares da região do acidente, por onde o carro do deputado deveria ter passado. Os radares das ruas Pedro Viriato Parigot de Souza e Monsenhor Ivo Zanlorenzi, as vias rápidas que cortam o bairro Mossunguê, registraram a passagem de centenas de carros nas horas anteriores ao acidente. O carro que estava sendo usado por Carli Filho no momento do choque não consta nos registros, que captam até mesmo os veículos que não excedem o limite de velocidade.
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A Polícia Civil solicitou à URBS os relatórios de todos os carros que passaram pelos radares perto do acidente das 23h do dia 6 de maio às 2h da data seguinte - o acidente ocorreu por volta da 0h40. A informação sobre onde o deputado passou pode auxiliar nas investigações. Como resposta, a URBS enviou no dia 14 de maio 36 páginas de tamanho ofício com as placas, velocidades e as faixas usadas pelos veículos. Nenhuma linha traz a placa do carro Passat registrado no nome da empresa do pai do ex-deputado.
O radar mais próximo do acidente fica na Ivo Zanlorenzi quase na esquina com a Rua Gra Nicco, a cerca de 600 metros do local do acidente. O aparelho gravou as placas de 210 carros das 23h do dia 6 de maio às 2h do dia seguinte. Mas estranhamente deixou de registrar as passagens de carros por uma das faixas. Segundo os relatórios anexados no inquérito, durante três horas a faixa mais próxima do radar não foi trafegada por nenhum veículo.
Um radar perto da casa do deputado, no mesmo bairro onde se deu o acidente, marcou 523 carros pelas três pistas no mesmo período.
Radar perto do acidente não marca nada
Um dos radares da Rua Pedro Viriato Parigot de Souza, a via rápida que faz o sentido centro-bairro onde o então deputado provavelmente trafegou antes de pegar a Ivo Zanlorenzi, que faz o sentido contrário, omite as placas dos veículos. Colocado perto da esquina com a João Falarz, o radar captou apenas 32 veículos que passaram pela pista 1, a mais próxima do aparato. Apesar de trazer a velocidade, a coluna onde deveriam estar as placas está em branco.
Perícia contratada pela família de Gilmar Rafael Yared, uma das vítimas do acidente, dá conta de que o deputado desenvolvia velocidade de 191,52 quilômetros por hora em uma subida de pouco menos de 6 graus. Para chegar a esse deslocamento, dificilmente ele dobrou em uma rua alternativa que não passasse pelo radar, segundo comentou um perito que esteve na reconstituição do acidente nesta semana.
A perícia particular também questionou imagens de um posto de gasolina que teriam sido adulteradas.
Nova solicitação, ainda sem o carro usado pelo deputado
A Delegacia de Delitos de Trânsito (Dedetran) pediu então para a URBS mandar um relatório contendo todos os veículos que passaram nos equipamentos fiscalizadores das ruas Carlos de Carvalho e Padre Agostinho - as duas principais vias que levam do restaurante onde o ex-deputado jantou e bebeu até a região do acidente.
A resposta veio no dia 9 de junho, mas novamente sem trazer informações sobre o carro que o então deputado estadual dirigia. O radar na Carlos de Carvalho, perto do número 2191, apenas pega as placas dos carros em duas das faixas - a central e a mais perto do aparelho. Já a da Padre Agostinho, perto da Rua Dona Alice Tibiriça, omite a faixa perto do radar e registra as duas mais afastadas. Nenhum dos relatórios trouxe a placa do carro usado pelo deputado.
Desde as 14h04, nenhum radar capta deputado
"Posto isso, aproveita-se o ensejo", nas palavras assinadas pelo presidente da URBS Marcos Isfer em um dos ofícios encaminhados para a polícia, a URBS resolveu enviar as ocorrências do Passat em todo o dia do acidente. Segundo o relatório, das 11h57 às 14h04, o carro passou por 10 radares, sempre abaixo de 60 quilômetros por hora. Depois disso, até a meia-noite, nenhum radar capta o carro dele, segundo o ofício da URBS.
"Marcamos uma reunião na sexta-feira (26) com o Marcos Isfer para esclarecer essas questões", disse o advogado que representa a família de uma das vítimas fatais do acidente, Elias Mattar Assad. A URBS se dispôs a submeter os radares à perícia particular.
Sistema é usado para planejamento urbano
O Leitor Automático de Placas (LAP) é usado pela prefeitura no planejamento urbano. A partir do tráfego registrado pelos radares, as políticas de melhorias de trânsito são articuladas. Segundo o coordenador da unidade de pesquisa e estatística e equipamentos de trânsito da URBS, Alvacir Gonçalves Mendes, o sistema funciona como um escâner. "Não existe sistema que leia 100% das placas", disse Mendes.
De acordo com a diretora de trânsito da URBS, Rosangela Battistella, condições climáticas e falta de iluminação também poderiam influir no LAP. Sobre os relatórios onde os radares não captam nenhum carro, ela afirma que, na madrugada, os motoristas evitam trafegar perto do radar.
Os motoristas que desejam aproveitar o fato de algumas faixas não terem sido captadas pelo LAP para pisar mais fundo no acelerador podem acabar pagando pesadas multas. No caso de uma infração de excesso de velocidade, que é captada por placas no solo, o sistema usa um flash invisível a olho nu para registrar a imagem do veículo.
Sobre o caso do deputado, Rosângela ressalta que o itinerário dele ainda não está claro. "Ele pode muito bem ter evitado os radares", estima.
Dois jovens morreram; deputado renunciou
O violento acidente aconteceu na madrugada do dia 7 de maio. O deputado dirigia um Volkswagen Passat de cor preta, que acabou batendo contra um Honda Fit de cor prata, ocupado pelos jovens Gilmar Rafael de Souza Yared, 26 anos, e Carlos Murilo de Almeida, 20, que morreram no local. Após a colisão, os carros foram parar em uma via local paralela à Monsenhor Ivo Zanlorenzi. Pedaços de lataria, vidros e ferros ficaram espalhados por cerca de cem metros. Os dois ocupantes do Honda, morreram no local.
O acidente ganhou repercussão nacional após a Gazeta do Povo revelar que Carli Filho tinha 130 ponto na carteira de habilitação e do exame do Instituto Médico Legal informar que ele conduzia o veículo em estado de embriaguez. O caso resultou na primeira renúncia de um deputado estadual na história do Paraná. Além disso, expôs um histórico de multas de políticos e de 68 mil cidadãos que dirigiam com a carteira de habilitação suspensa.
Depois da colisão, o governo do estado anunciou que passaria a "caçar" os motoristas não devolvessem carteiras de habilitação suspensa 48 horas depois de serem notificados. A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) anunciou que poderia inclusive prender sob flagrante de crime de desacato quem não devolvesse o documento.
Nesse universo em situação irregular, 26 deputados estaduais já receberam notificação de suspensão de carteira. . Uma lista de motoristas com carteira suspensa que não fizeram a entregara no Detran-PR divulgada pelo governo do estado apontou ainda três dos 30 deputados federais paranaenses e o ministro Paulo Bernardo, do Planejamento.
A população também participou protestando contra a impunidade no trânsito, cobrando respostas da polícia, do Judiciário e da Assembleia Legislativa. Saiu às ruas em passeatas e fez campanha com adesivos nos carros "190 km/h é crime".
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