Tenho profunda admiração por pessoas que têm e cuidam de animais. E elas são em número grande e crescente. O companheiro mais popular é o cachorro, sem dúvida. Em segundo lugar, vêm os gatos, que também têm o seu público humano, já que os gatos sabidamente dominam seus donos com habilidade. Há também passarinhos e ratinhos brancos em gaiolas; papagaios; peixinhos em aquário, que teriam aliás propriedades calmantes. Conheci o primo exótico de uma amiga que cultivava cobras. O aspecto dramático é que as cobras têm de ser alimentadas com ratos vivos. O quarto do rapaz era uma sessão da National Geographic ao vivo e em cores, com um toque de terror. Há quem secretamente alimente filhotes de leão ou de onças em quintais clandestinos. Outros gostam de macacos, que carregam nos ombros como troféus. E as apreensões de contrabando de animais que vemos na tevê também dão uma medida desse amor universal que se transforma em crime alguém lá na ponta da contravenção faz qualquer coisa para ter um bicho. Enfim, a fauna dos amantes de animais é grande e variada, e quanto mais penso, mais admiro esses naturalistas espontâneos.
Como o tempo que passei domesticando meus filhos esgotou-me ao longo dos anos, a simples idéia de colocar um cachorro, um canguru ou um porquinho aqui no apartamento me assombra. Teria de alimentar, cuidar, levar para passear e fazer necessidades, às vezes para o veterinário, quem sabe sofrer com a morte somos sentimentais, acabamos nos afeiçoando aos animais como se fossem gente. Para mim, ter um bicho seria mais ou menos como a piada: coloque um bode na sala, conviva com ele durante dois meses, e depois livre-se dele. A sua vida ficará subitamente maravilhosa e o mundo vai sorrir.
Outro problema é que percebi que as pessoas vão ficando parecidas com seus animais de estimação pessoas carrancudas gostam de bulldogs, encrenqueiros amam os pitbulls, crianças delicadas adoram hamsters. Mulheres esguias desfilam com galgos. Um amigo meu gostava de um papagaio de perfil idêntico ao dele a voz também era parecida. Velhinhas enfeitadas não saem de casa sem um pequinês cheio de fitas. Talvez esteja aí a raiz do meu medo que o animal me revele aos outros. Mas tem outro aspecto, que alguns psicólogos ponderam: o amor desmedido aos bichos seria sinal de um deslocamento de afetos, marca de uma dificuldade de lidar com a indócil condição humana, que não permite coleira; ou compensação urbana à solidão moderna. Teorias, enfim, que dão boas conversas de bar.
Uma coisa é certa: nesse aspecto, é uma dádiva que as calçadas de Curitiba sejam as piores do mundo, o que nos obriga a olhar sempre atentamente para o chão. Pisar em cocô de cachorro é um desastre que provoca em mim os mais terríveis sentimentos: isso sim é uma verdadeira cachorrada do dono do bicho, é claro.
Cristovão Tezza é escritor.
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