Uma das torturas que a idade vem me dando é o ato simples de escolher roupa e relacioná-la com o meio ambiente. Se já é difícil acertar em casa, em viagem a coisa é pior. Sábado fui a Palmas, em Tocantins, participar de uma feira literária que, em várias tendas armadas numa imensa praça pública, reunia atrações como poetas de cordel, escritores e cantores, a multidão circulando entre barracas e carrinhos de pipoca. Antes de sair, consultei a internet seriam 36 graus de temperatura, e assim viajei feliz e desarmado, até descobrir o poder sinistro do ar-condicionado. Ao descer do avião, depois de contemplar do alto a beleza impactante do Rio Tocantins e sua imensa represa no meio daquele mundão sem fim, senti o bafo do calor, mas logo em seguida, refugiado numa caminhonete, passei para o frio cortante de 10 ou 12 graus, que era o padrão que eu encontrava em toda parte. Bem, preocupar-se com as variações do tempo, criando hipóteses de janela (vai chover? vai esfriar?) e com vento encanado (há quem isole frestas com fita crepe) é mesmo coisa da idade já me conformei. Não me lembro de nenhum momento dos meus 20 ou 30 anos em que o tempo (que tempo? o tempo não existe!) fizesse alguma diferença. Hoje, farejo as variações de temperatura e o humor das nuvens com a pertinácia canina de um detetive carrancudo.
A volta parecia tranquila até a conexão em Brasília, um céu azul de brigadeiro, e tomei sem angústia o previsto chá de espera de três horas. Mais tarde, o avião para casa já ameaçava embicar na pista, portas fechadas, quando a voz do comandante avisou que raios e trovões em Curitiba haviam dado uma pane em todo o sistema de comunicação aérea na região e a decolagem estava momentaneamente suspensa. Por felicidade, contrariando minha norma de sempre carregar livros até 200 páginas em viagem, desta vez tinha comigo um tijolo três vezes maior Liberdade, de Jonathan Franzen, um belo romanção, ideal para dias de chuva e salas de espera. A história foi me agarrando pelo colarinho, um triângulo amoroso de fracassos dos anos 1970 em diante, um retrato agudo da vida americana das últimas décadas, de modo que não senti o tempo passar. Enfim no ar, o céu continuava azul e infinito até que entrei súbito nas fronteiras sombrias da minha terra, numa mudança radical de cenário, a descida turbulenta e a tarde fria, chuvosa e escura.
Enfim em casa, passei frio uma última vez torcer é sofrer, mas desta vez a ansiedade foi libertadora. Cheguei a tempo de assistir inteira a vitória maravilhosa do Atlético diante do Santos, uma equipe que, pela sua leveza festiva e quase invencível, em momentos parece a versão futebolística dos globetrotters, o célebre time de exibição de basquete que correu mundo. Mas domingo, além da chuva, encontrou um Atlético emocionante e firme pela frente. Tudo somado, uma semana com final feliz.
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