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Fernando Martins

Escassez de bom senso

Pesquisa publicada em novembro na revista Science comprovou o que o cotidiano não se cansa de demonstrar, mas que não raras vezes é ignorado: a escassez de recursos, materiais ou imateriais, afeta para pior a forma como as pessoas tomam decisões. Isso vale para famílias, empresas e governos. E serve de alerta neste momento em que os políticos trabalham às pressas – a falta de tempo – para dar respostas rápidas às insatisfações demonstradas nas manifestações de rua.

A partir de testes em voluntários, estudiosos das universidades de Chicago, Harvard e Princeton concluíram que qualquer pessoa, quando é submetida à falta de algo de que necessite, prioriza a solução de problemas imediatos deixando de lado questões aparentemente menos urgentes, porém mais importantes no longo prazo.

É o caso, por exemplo, de quem contrai empréstimos com juros altos para pagar despesas do dia a dia ou satisfazer um desejo de consumo. O imediato toma importância maior do que deveria ter. E "cega" a pessoa diante do fato de que a dívida que contraiu será muito mais prejudicial às suas finanças no médio prazo.

A pesquisa indica que o mesmo raciocínio vale para outros recursos escassos, como o tempo. Quem é muito ocupado costuma dedicar atenção a assuntos que exigem decisão no momento, mas que não necessariamente são importantes. O risco, nesse caso, é tomar más decisões quando se é levado a enfrentar questões de fato relevantes. Isso porque não houve tempo de maturar a solução adequada. A sabedoria popular até cunhou uma expressão para isso: "A pressa é inimiga da perfeição".

Essa é a ameaça que o país corre atualmente. Os dirigentes brasileiros negligenciaram por anos as questões prementes para a sociedade. Não discutiram. Não formaram consensos. Mas os protestos de rua provocaram neles a sensação de urgência para dar respostas à sociedade diante do risco de escassez do recurso que mais importa aos políticos: o voto nas eleições de 2014. Não será surpresa se, dentre tantas decisões rápidas, uma boa parte delas for ruim.

Pouco se discute, por exemplo, sobre o custo do pacote de bondades que o Congresso está votando. Há ainda temas que entraram em debate e sobre os quais existe enorme divergência ou desconhecimento. A reforma política é um deles. Outro é a concessão do passe livre para todos os estudantes, independentemente da renda ou do fato de o aluno frequentar escola pública ou privada. Está na pauta do Senado desta semana, sem qualquer avaliação de quanto custará. Ninguém lembrou também de discutir como se evitará a falsificação de carteiras de estudantes para que qualquer um usufrua do benefício, como hoje ocorre com a meia entrada nas atrações culturais.

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