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O jurista e filósofo inglês Jeremy Bentham (1748-1832) concebeu, na segunda metade do século 18, um modelo racional de prisão. Consistia num edifício com um grande pátio interno para o qual estavam voltadas todas as celas. Na posição central, uma única pessoa podia vigiar milhares de presos sem muito esforço. Bentham batizou sua penitenciária de panóptico – o olho que tudo vê. Aquela ideia moldou muito mais que o atual sistema prisional. Há algo dela em áreas tão distintas como educação, saúde e comunicações pela internet.

A arquitetura do panóptico foi reproduzida nas principais instituições contemporâneas: o quartel, o hospital, o manicômio, a fábrica e a escola. E não se resumiu a isso. Também se replicou na ideia do controle de muitos por poucos e na necessidade de disciplinar as massas. Conforme argumento já clássico do filósofo francês Michel Foucault (1926-1984), o Estado moderno que nascia precisava de cidadãos reeducados para o trabalho industrial e para uma nova vida na sociedade urbana.

Aos poucos, o mundo se acostumou a essa visão. Ficou natural se referir à "grade" e às "disciplinas" curriculares das escolas sem imaginar que os termos remetem, ainda que longinquamente, à prisão e ao controle imaginados por Bentham. Por fim, o panóptico deixou a esfera pública e entrou no seio das famílias – a disciplina passou a ser o centro da criação dos filhos.

Há, porém, outra forma de panóptico que entrou na vida contemporânea e parece estar se naturalizando: as novas tecnologias de comunicação. Câmeras, celulares, internet e redes sociais on-line facilitaram profundamente a difusão de informações, mas também o controle familiar, social e comercial.

Pais hoje não se preocupam tanto com a disciplina dos filhos. Mas não deixam de monitorá-los de forma remota, nem que seja numa simples ligação de celular. Gigantes da internet vasculham com seus algoritmos as navegações dos internautas para controlar suas preferências e, assim, vender-lhes publicidade.

Poucos se importam com isso. Mas o alerta vem soando. Em junho, ao ser revelado que o governo dos EUA monitorava indiscriminadamente telefonemas e e-mails ao redor do planeta, o presidente Barack Obama vaticinou: "Não se pode ter 100% de segurança e 100% de privacidade". No Brasil, a Justiça Eleitoral cedeu dados pessoais de 141 milhões de eleitores a uma empresa comercial sem consultar ninguém. Recuou só quando o acordo se tornou público.

A sociedade disciplinar analógica encontrou seus escapes. Paradoxalmente, um deles é a educação de boa qualidade. Quem aprende a pensar tem a oportunidade de se libertar da disciplina cega. Com a emergência do panóptico digital, também será necessário encontrar formas saudáveis de resistência que garantam a liberdade humana.

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