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fernando martins

Quando você é o produto, e nem se dá conta disso

Muita gente ficou apreensiva com a revelação, na semana passada, de que alguns sites vendem dados pessoais – CPF, endereço residencial, e-mail, número de telefone, histórico de ligações de celular, conteúdo de mensagens de WhatsApp e até mesmo contatos de vizinhos. A sensação, diante da facilidade com que as informações de cada um circulam na internet, é de impotência e receio em relação a possíveis fraudes que venham a ser cometidas por aqueles que se apropriem dos dados dos cidadãos honestos.

O curioso é que o temor acerca da disseminação de dados não se reproduz numa escala em que informações pessoais são usadas de uma forma muito mais livre e ampla do que a maioria se dá conta. Na internet inclusive circula uma máxima que indica bem como a discussão acerca da privacidade on-line é ainda mais profunda. Diz o ditado: “Se você não está pagando por um serviço na web, então você é o produto”.

A discussão sobre os limites de uso de dados pessoais – seja por quem for – se faz cada vez mais urgente e necessária

Os principais serviços na internet que aparentam ser gratuitos (de redes sociais a buscadores de sites, passando por provedores de e-mail) na verdade cobram um preço do usuário: os dados de navegação e as preferências do internauta. Essas informações basicamente são usadas para traçar um perfil da pessoa como consumidor. São vendidas pelo site para empresas interessadas na publicidade direcionada especificamente para esse usuário da rede. Quando alguém assina os termos de compromisso de uso do serviço – o que poucos leem –, está concordando com isso. Na prática, é um contrato.

Muita gente já deve ter tido a experiência de usar um buscador de informações para fazer uma pesquisa acerca de determinado produto ou serviço e, logo depois, ao acessar outro site, começa a ter a tela de seu computador inundada por propagandas daquilo que havia pesquisado. Seu interesse no produto foi vendido para um anunciante. Há ainda um famoso serviço de e-mail que tem “robôs” que leem tudo o que o usuário escreve para traçar ser perfil com o objetivo de ser alvo de publicidade.

Os gigantes da internet alegam que as informações dos internautas não são acessadas por humanos, mas apenas pelos seus sistemas informatizados e que só são utilizadas para a venda de publicidade. Mas dados são dados e não há 100% de segurança de que eventualmente essas informações não serão usadas de outra maneira.

Isso inclusive já ocorreu. No ano passado foi publicado um polêmico estudo de pesquisadores das universidades de Cornell e da Califórnia, associados ao Facebook, mostrando como a manipulação dos algoritmos da rede social podia mudar o humor dos usuários. A pesquisa, feita sem o consentimento de 700 mil pessoas, pretendia verificar se, ao reforçar o feed de notícias do internauta com informações mais positivas ou negativas, o humor da pessoa acompanharia o conteúdo ao qual havia sido exposto. O estudo comprovou a tendência do contágio emocional – o que mostra o poder de que as redes sociais dispõem e como elas podem usar e manipular dados pessoais em seu proveito próprio.

Obviamente, é muito difícil viver hoje off-line. Por isso, a discussão sobre os limites de uso de dados pessoais – seja por quem for – se faz cada vez mais urgente e necessária.

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