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O canadense Michael Ibsen, 55 anos, trabalha como marceneiro em Londres. Fez o caminho de volta que sua mãe havia empreendido décadas antes, quando imigrou da Inglaterra para a América do Norte. Na juventude, Ibsen tentou a carreira de músico erudito em orquestras da Europa. Tocava trompa. Mudou de carreira, como tantos outros. Decidiu ganhar o pão de cada dia no talhar da madeira. Era um anônimo.

Na semana passada, ganhou espaço nos jornais do mundo inteiro como coadjuvante do anúncio da descoberta da ossada do lendário rei inglês Ricardo III – que governou entre 1483 e 1485 e que foi retratado por Shakespeare como um tirano vil e abjeto. Uma amostra do DNA do marceneiro permitiu a arqueólogos confirmarem que os restos mortais, encontrados sob um estacionamento na cidade de Leicester, eram do monarca da dinastia Plantageneta.

Ibsen não sabia de sua origem nobre até pouco antes. Mas estudiosos de genealogia concluíram que ele é descendente direto, da 17.ª geração, da irmã mais velha do rei, Ana de York. "Muito surreal", comentou o marceneiro a jornais britânicos.

Como Ricardo III não tinha filhos à época de sua morte, o marceneiro poderia ser o atual herdeiro do trono britânico, não fossem as reviravoltas da história. Seria o centro das atenções e dos holofotes, como hoje o são os príncipes Charles e William – que, então, se veriam simples plebeus. "Eu definitivamente não seria um bom rei. Não sei ser um bom tomador de decisões", reconheceu o humilde Ibsen. "Acho que não gostaria de estar no olho do público; deve ser uma vida difícil."

Mas o marceneiro canadense nunca terá de passar pelos dilemas de um rei. A batalha de Bosworth tirou não apenas a vida de Ricardo III. Apeou do trono, para sempre, aquela família. A dinastia Tudor, que a sucedeu e sob a qual Shakespeare viveu, tratou de legar à posteridade a imagem repugnante do último rei Plantageneta – algo que agora, com as recentes descobertas históricas, busca-se desmentir.

As areias do tempo são, afinal, implacáveis. Sepultam títulos, poder, status, riqueza. Por isso a história de Michael Ibsen – o marceneiro que poderia ter sido rei – é simbólica. Serve para lembrar que o que se tem é absolutamente fugaz, embora por vezes pareça perene. O importante é o que se faz. São as ações de cada um que vão sobrar e que ficarão na memória das futuras gerações.

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