Na semana passada, a demarcação contínua da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, deu o que falar. Dentro e fora do Supremo Tribunal Federal. Até porque, quando o placar tendia para os indígenas, o ministro Marco Aurélio Mello resolveu botar a bola embaixo do braço e suspender a partida ao pedir vista ao processo. De qualquer modo, foi uma sessão histórica.

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Principalmente pela brilhante intervenção da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, ao dar seu voto, citando, inclusive, Darcy Ribeiro. Segundo ela, o estado de Roraima desrespeitaria frontalmente a Constituição ao permitir a ocupação de uma área reconhecidamente indígena por não-índios. "A Constituição determina que as áreas de ocupação imemorial sejam demarcadas na sua integralidade, sem fragmentações", sapecou. Além disso, lembrou que a ocupação da área pelos índios é muito anterior à existência do estado de Roraima. Assim, não se pode falar em "tornar" propriedade da União algo que não pertencia ao estado. Outra alegação rebatida pela ministra foi a de que o estado teria comprometida sua condição de "ente federado", uma vez que aproximadamente 46% de sua área total são de reservas. Comparou o tamanho da área de Roraima não ocupada por índios – os cerca de 54% restantes, lembrando que esse espaço é maior que alguns estados brasileiros e até mesmo que países como Bélgica e Israel, "com populações muito superiores – na casa dos milhões de habitantes". A tese "cai por terra com esses argumentos aritméticos", disse.

Parte do noticiário da imprensa, aliás, foi mal-intencionada. Insistiu na tecla de que "a área engloba cerca de 1,7 milhão de hectares" e que "na reserva há 17 mil indígenas". Ou seja, insinuava que seria muita terra pra pouco índio, o que validaria a pretensão dos arrozeiros e quetais.

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E tem mais

Para que não digam que eu só cito a revista Pesquisa, da Fapesp, vamos de Radis. Isso mesmo. Radis é uma publicação impressa e on-line da Fundação Oswaldo Cruz, editada pelo Programa Radis (Reunião, Análise e Difusão de Informação sobre Saúde), da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. No número de novembro, o assunto de capa foi saúde na Região Centro-Oeste – "Panorama tão rico quanto vulnerável".

Vale a pena ler. Quem não recebe a revista pode acessar www. ensp.fiocruz.br/radis.

Segunda maior região do Brasil em extensão territorial, reúne boa parte de nossas reservas indígenas e assiste ao acelerado crescimento do agronegócio, como mostra a reportagem de Adriano De Lavor. A professora Rosani Moreira Leitão, da Universidade Federal de Goiás (UFG), denuncia a situação dos carajás, cujo território tem sido sistematicamente invadido: "As margens do Rio Araguaia estão tomadas por hotéis de luxo e mansões, o que os impede de trabalhar". Já os tapuias, quase foram dizimados, enquanto dos avá-canoeiros restaram apenas seis no estado.

E o pesquisador Ricardo Ventura Santos lembra que as terras indígenas constituem 15% dos 8.547.403,5 quilômetros quadrados do território nacional. "Cabe a essas populações o ônus de manter as terras preservadas", diz.

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Francisco Camargo é jornalista.